quarta-feira, 7 de setembro de 2016

O roteiro da repressão policial às manifestações.

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A reportagem da Ponte acompanhou três atos na semana do impeachment e constatou que a repressão por parte da PM segue um roteiro quase sempre igual: o impedimento da passagem dos manifestantes, o disparo de bombas e balas de borracha e manobras de encurralamento e perseguição dos participantes (Foto: Daniel Arroyo)
na Ponte

A semana em que se confirmou o impeachment de Dilma Rousseff foi marcada por protestos pela saída do presidente Michel Temer em todo o país, muitos destes violentamente reprimidos pelas forças policiais. Em São Paulo, a reportagem da Ponte acompanhou três atos, e pôde constatar que – assim como acontece em manifestações com outros temas, como contra o aumento das passagens – a repressão por parte da Polícia Militar segue um roteiro quase sempre igual: o impedimento da passagem dos manifestantes, sob a alegação de que não houve comunicação prévia sobre o trajeto; o disparo de bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha para dispersar a manifestação, e o início de manobras de encurralamento e perseguição dos participantes, incluindo golpes de cassetete e agressões verbais (assista ao vídeo acima).
Nesse meio tempo, o levantamento de barricadas para atrasar a movimentação da Tropa de Choque e depredações realizadas por pequenos grupos, que deveriam ser tratadas de forma isolada, servem de pretexto para mais repressão e a legitimação da violência do Estado no discurso da maior parte dos meios de comunicação, como avalia o tenente-coronel da reformado PM, Adilson Paes de Souza.
O primeiro ato aconteceu na segunda feira (29/08), puxado pelo movimento Povo Sem Medo e pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST). A manifestação seguia sem problemas. Saiu da praça do Ciclista, na avenida Paulista, e começou a caminhar no sentido Paraíso. No meio do caminho havia a tropa do braço, e o ato foi bloqueado na altura do Museu de Arte de São Paulo (Masp).
O  comandante da PM argumentava que ninguém havia informado o trajeto. Quando foi então comunicado, alegou que as informações não eram claras. Com a manifestação parada, já ficava claro que haveria repressão. Alguns manifestantes tentavam argumentar, mas a PM não aceitava essa aproximação, dificultando muito o diálogo. O impasse seguiu até a primeira bomba de efeito moral ser atirada próxima à linha que separava os policiais militares dos manifestantes que buscavam negociar. Enquanto a passagem da marcha era impedida, outra linha de PMs protegia o acampamento a favor do impeachment, em frente ao prédio da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
O que se seguiu a partir daí foi uma intensa repressão, com uso de gás lacrimogêneo, bombas de efeito moral, tiros de bala de borracha e os novos caminhões da Tropa de Choque e seus jatos d’ água. Os manifestantes tentavam bloquear e atrasar o avanço da PM espalhando e ateando fogo em sacos de lixo e lançando algumas garrafas contra a tropa.

Segundo ato

O segundo ato “Fora Temer”, convocado pelo Coletivo Pela Democracia, ocorreu na terça feira (30/08), na mesma avenida Paulista. A manifestação saiu do Masp e caminhou até a praça Roosevelt. No caminho, em forma de jogral, os manifestantes decidiram que iriam até o jornal “Folha de S.Paulo” protestar contra o veículo considerado “golpista”. Ao ser informada, já na praça Roosevelt, de que a manifestação seguiria até a “Folha”, o comando da PM impediu a passagem da marcha e pediu 20 minutos para decidir o melhor caminho.
Com medo de emboscadas, os manifestantes decidiram dar a volta na praça e seguir pela rua Rego Freitas, sentido largo do Arouche, e dali seguir até o jornal. A PM não havia bloqueado esse trecho. No caminho, teve início a repressão, com a agressão dos jovens sem nenhum motivo, com base na suposição de que naquele momento a manifestação tinha se tornado  uma ameaça aos policiais. Duas adolescentes que foram detidas na ocasião denunciaram que foram chamadas de vagabundas e que ouviram um PM dizer que se fosse um ditadura “o bicho ia ficar feio”.

Terceiro ato

O terceiro protesto, na quarta-feira (1º/09), foi o maior de todos até então. Por volta das 19 horas, partindo do Masp, no mínimo 10 mil pessoas iniciaram uma marcha com destino ao Centro de São Paulo. Na avenida Consolação, alguns manifestantes passaram  a ocupar as duas vias e arrastaram e queimaram sacos de lixo para impedir totalmente o fluxo de carros. Poucos minutos depois, policiais em motos chegaram para retirar as barricadas e dar início à repressão ao protesto.
A partir de então, grandes grupos de manifestantes ocuparam a região central da cidade respondendo à agressão da PM com pedras e mais barricadas. Próximo ao largo do Arouche, uma moto que estava estacionada na calçada foi posicionada no meio da rua por participantes do ato. Após uma discussão sobre se o veículo era de algum trabalhador – e, nesse caso, não seria destruída – ou de alguma empresa privada, o grupo deixou-o de lado e continuou a caminhar. Em seguida, elegeu como alvo de pedras e chutes uma viatura da Polícia Civil.
Naquela altura, os manifestantes decidiram mais uma vez ir até a “Folha de S.Paulo”. No caminho, um atropelamento. Após ouvir gritos de “golpista”, o motorista de uma BMW que aguardava a passagem do ato decidiu avançar e atropelou uma menina. A revolta foi geral. Muitos gritavam para que a placa fosse anotada, outros pediam por socorro. A garota, completamente atordoada e sangrando, se levanta, contraria os pedidos para permanecer deitada e diz:
– Eu resisto. Eu resisto. Fora Temer!
A reportagem da Ponte Jornalismo procurou a assessoria de imprensa da Polícia Militar para comentar sua atuação nas manifestações, mas não teve retorno.
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