domingo, 22 de janeiro de 2017

Lula: "Comparado a governo Temer, FMI é esquerda porreta"

Lula: Se o juiz precisa que a imprensa acabe com a imagem de uma pessoa antes de ser julgada, não precisa de juiz. Só da imprensa



"Quando o Meirelles começou a falar do ajuste (durante o Fórum Econômico Mundial em Davos, Suíça), ela afirmou que a prioridade das políticas econômicas precisa ser o combate a desigualdade social. Uma coisa que nós sabíamos desde 2003 quando resolvemos fazer política social", ironizou.

Em Davos, Christine Lagarde afirmou que o FMI está revendo seus conceitos e adotou postura crítica a políticas econômicas concentradas em austeridade fiscal e desconectadas de seus impactos sociais. "Não sei por que as pessoas não escutaram (que a desigualdade é nociva), mas, certamente, os economistas se revoltaram e disseram que não era problema deles. Inclusive na minha própria instituição, que agora se converteu para aceitar a importância da desigualdade social e a necessidade de estudá-la e promover políticas em resposta a ela", disse a francesa, segundo relato da BBC.

Ao desencadear o processo de debates do congresso que deve levá-lo à presidência do PT, em abril, Lula deu ênfase ao tema da economia como forma de o partido recuperar sua imagem a partir de seu legado após 12 anos de governo. "Vamos ter que dedicar um tempo extraordinário para fazermos um programa em que as pessoas acreditem que é possível de ser executado. E nós temos moral, já fizemos isso e podemos fazer outra vez", aumentando o tom contra o governo de Michel Temer.

"Um governo que resolve fazer um ajuste que coloca educação na rubrica de gastos é um governo que condena este país a não ter futuro, a não ter inovação. É um governo que não quer investimento em tecnologia, não quer competitividade internacional, e que quer continuar sendo exportador de commodities. Se tem um governo que deu razões para a gente brigar é este", afirmou. "Portanto, nós temos instrumento para brigar como jamais tivemos."

O ex-presidente sinalizou, ainda, que o partido deve compor uma frente com movimentos sociais numa campanha pela antecipação de eleições diretas. "Eu acho que nós temos que brigar agora, mas nós temos que ter o discurso correto. O discurso correto é aquele que possa convencer os movimentos sociais a vir junto com a gente. A trabalhar junto. E a gente não pode esperar 2018. Nós até podemos suportar, mas a sociedade brasileira vai aguentar? O pessoal que está perdendo emprego vai aguentar?", provocou, observando que Temer tem pressa em "destruir aquilo que nós construímos", citando o processo de desmonte da Petrobras e o recuo na distribuição de recursos do pré-sal para saúde e educação. "Vamos ao debate com aqueles que não gostam de nós, com aqueles que não acreditam em nós, com aqueles que foram às ruas para derrubar o PT – porque essa gente já acreditou em nós."

Até mesmo críticas internas recebidas de economistas próximos ao partido – de que o modelo do PT no passado teria sido equivocado ao concentrar a economia baseada no consumo e não no desenvolvimento industrial – foram abordadas por Lula em tom entre a ironia e a crítica: "Se alguém me apresentar um segmento industrial que vai fazer investimento se não houver consumo, eu retiro o que eu disse. Agora vejamos, com o desemprego chegando na casa dos 12% e com perspectiva de chegar a 14%, com os empresários devendo os olhos da cara, quem é que vai fazer investimento para acelerar o desenvolvimento neste país? Como é que a gente vai resolver o problema? Apenas exportando? Proibindo a entrada dos penduricalhos da China no Brasil? Como a gente vai fazer se o Estado brasileiro, a partir da União, não tiver coragem de ser o indutor do crescimento econômico", provocou.

O papel dos bancos públicos e de uma política monetária anticíclica no momento em que a crise global de 2008 ameaçou o Brasil foi destacado. Lula argumentou que as instituições financeiras controladas pelo Estado não têm de ter prejuízo, mas que também não precisam competir com a lucratividade dos bancos privados. "Temos que ter coragem de fazer com que os bancos públicos voltem a ser públicos. O BNDES tem que voltar a fazer investimentos. É preciso liberar mais recursos do compulsório (o volume de depósitos a vista nos bancos que ficam retidos e não podem ser empregado em operações de crédito) para financiar o desenvolvimento industrial."

Ousadia

Com medidas de injeção de recursos na economia, Lula admite ainda a utilização de parte das nossas reservas cambiais acumuladas em mais de US$ 370 bilhões desde a década passada, com objetivo de promover investimentos em infraestrutura. "Eu tenho uma divergência com nossos amigos economistas porque eu acho que a gente só tem uma saída: a gente precisa voltar a incluir outra vez os mais pobres no orçamento da União. E a gente tem de voltar a discutir os benefícios trazidos para a economia com o a política de aumentos do salário mínimo, o que significou a quantidade de políticas microeconômicas que nós fizemos neste país", disse.

O endividamento público também foi abordado com ousadia por Lula, no ponto de vista do pensamento corrente entre os colunistas e agentes econômicos que pautam o governo Temer. "Se for necessário, tem de aumentar. Quem está falando fez parte de um governo que reduziu a dívida pública de 60% para 34% do PIB. A dívida não pode aumentar se você não estiver construindo ativos produtivos. Mas se você fizer um endividamento para você construir ativos, que significa daqui dois ou três anos aumentar aumentar a usar esse ativos, pode fazer", defendeu, observando que os Estados Unidos em 2007 tinham dívida pública bruta de 64,7% do PIB e hoje ela é de 108%, e citando Alemanha, França e Japão entre as economias desenvolvidas com endividamento acima de 100% do PIB. "E aqui no Brasil fizeram a opção de fazer o ajuste em cima de quem não deveria ter ajuste, que é o povo trabalhador e o povo pobre desse país.

O ex-presidente considera que o movimento sindical e social tem ainda de discutir com a sociedade o significado da Operação Lava Jato na economia do país. "Está na hora de os economistas do PT produzirem diagnósticos e propostas. Eu quero saber quais os efeitos. Porque todos nós queremos que se apure, todos nós queremos que os ladrões sejam presos, aqui ninguém está defendendo quem praticou corrupção. Agora não dá para, em em nome de combater a corrupção se quebrar a economia brasileira. É preciso separar."

A propósito, Lula voltou a dirigir críticas ao juiz de primeira instância Sérgio Moro, a quem denunciou junto a organismos internacionais como inapto a julgá-lo por demonstração de parcialidade, participação nas acusações e cerceamento ao direito de defesa. "Não se pode subordinar a apuração de corrupção à imprensa brasileira, que dita quem é culpado e quem é inocente. Se o juiz precisa que a imprensa acabe com a imagem de uma pessoa antes de ser julgada, não precisa de juiz. Só da imprensa", criticou. "E este é um assunto que o PT tem que discutir. E nós temos que discutir sem medo, porque se tem um partido que batalhou para combater a corrupção neste país, chama-se Partido dos Trabalhadores. E eu tenho orgulho de ter participado disso."
 

Fonte: RBA

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