domingo, 13 de agosto de 2017

Condenação de Lula sem provas fará ONU condenar Brasil.

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Desde a condenação de Lula pelo juiz Sergio Moro em julho que a imprensa internacional vem sendo tomada por sucessivas matérias sobre o caráter político do processo e sobre a falta de provas contra o ex-presidente.
Matérias recentes da imprensa estrangeira sobre o quadro político no Brasil mostram como é distorcido o noticiário brasileiro. Duas entre as várias e proeminentes publicações norte-americanas e europeias que torcem o nariz para o processo contra o ex-presidente abordaram a condenação do ex-presidente e o quadro político no país.
A mera leitura do artigo do economista e pesquisador Mark Weisbrot sobre a sentença de Moro contra Lula justifica a convicção do advogado Cristiano Zanin Martins de que, entre o fim de 2017 e o começo de 2018, a ONU abrirá investigação formal contra o Estado brasileiro por suspeita de perseguir o ex-presidente sob motivação política.
Weisbrot se concentra fortemente na inacreditável falta de provas e na coação de criminosos para que acusassem o ex-presidente a fim de escapar de suas penas. O artigo foi publicado na mais antiga revista norte-americana, a The Nation, sob o sugestivo título “Líder mais popular do Brasil foi condenado por corrupção sob evidências frágeis”.

Mark Weisbrot, na The Nation magazine
“O ex-presidente do Brasil Lula enfrenta o seu sexto julgamento por corrupção”, afirmou manchete da Reuters na semana passada. Para quase todos os consumidores da mídia internacional, era tudo o que precisavam saber. Após a sentença de nove anos de prisão proferida em 12 de julho, poucos teriam dúvidas quanto à sua culpa.
Lula da Silva, um dos presidentes mais populares da história brasileira, deixou o cargo com aprovação de 80%. Ele também é o líder nas pesquisas sobre as eleições presidenciais do próximo ano. Claramente, seus oponentes – incluída a maioria dos principais meios de comunicação do Brasil – gostariam de tirá-lo do jogo.
É isso que essas acusações são? Vale a pena examinar as provas no caso em que Lula foi sentenciado, especialmente porque o juiz Sergio Moro começou com o mais forte dos seis processos abertos contra ele.
Lula é acusado de aceitar suborno sob a forma de um apartamento de propriedade da construtora brasileira OAS. A empresa comprou um prédio no qual Lula pagava cotas de um apartamento barato (cerca de US$ 67.000). De acordo com o tribunal, a OEA remodelou apartamento muito maior, no valor de cerca de US$ 843 mil, e o ofereceu a Lula pelo preço do apartamento original.
Quase todas as provas contra Lula são do testemunho de um criminoso condenado, José Adelmário Pinheiro Filho.
A primeira coisa que parece engraçado é que quase todas as evidências contra Lula são dos testemunhos de um criminoso confesso, José Adelmário Pinheiro Filho.
Ele é um ex-executivo da construtora OAS que foi ator-chave no escândalo infame da Lava Jato. O escândalo envolveu corrupção maciça na empresa petrolífera estatal, na qual os subornos foram pagos pelas empresas de construção para receber contratos a preços inflacionados.
Pinheiro obteve redução de mais de 80% de sua pena de prisão de 16 anos em troca de seu depoimento contra Lula.
Claro que houve muitos casos nos Estados Unidos e em outros países em que, por exemplo, uma mafia ou um chefe do tráfico de drogas é condenado com a ajuda de testemunhos de alguém mais abaixo na cadeia alimentar.  Mas, em tais casos, normalmente esperamos ver algumas provas corroborantes e sérias de que o réu cometeu o crime como alegado pela testemunha criminal – talvez documentos, testemunhas oculares ou evidências físicas.
No caso contra Lula, pesquisa-se em vão a existências de prova na sentença condenatória de 238 páginas.
Além disso, de acordo com o sistema jurídico brasileiro, o juiz presidente neste caso, Sergio Moro, também é procurador. Não só isso, ele conseguiu manter as pessoas presas até que falassem.
International Bar Association (entidade que congrega sindicatos de advogados de todo o mundo) observa que “executivos seniores, mais acostumados a jatos particulares e hotéis de cinco estrelas, foram colocados em uma cela apertada de 12 metros quadrados com um banheiro aberto”, e observa que o CEO de uma grande empresa de construção e seu funcionário assinaram acordos de colaboração “após 105 dias de prisão policial e apenas cinco dias depois que os juízes derrubaram outro pedido de habeas corpus”.
As negociações de Pinheiro foram bloqueadas quando ele insistiu que Lula não teve nenhum papel na remodelação do apartamento – e ele contou a mesma versão da história que Lula.
O próprio Pinheiro passou cinco meses na detenção preventiva. O maior jornal do Brasil, a Folha de São Paulo, informou em junho de 2016 que as negociações de Pinheiro para o acordo de delação foram bloqueadas quando ele insistiu que Lula não teve nenhum papel na remodelação do apartamento e, de acordo com o relatório, repetiu a mesma versão da história que o ex-presidente.
Sobre o juiz: Moro foi pego várias vezes forçando as escalas da justiça no caso de Lula. No ano passado, teve que pedir desculpas ao Supremo Tribunal Federal por ter vazado na mídia conversas telefônicas entre Lula e seu advogado, entre Lula e Dilma e entre a esposa de Lula e seus filhos.
Moro também criou um enorme espetáculo de mídia com a condução coercitiva de Lula para interrogatório – uma prisão desnecessária, já que o ex-presidente sempre se ofereceu para responder a perguntas.
Mais de 200 policiais foram enviados para sua casa, com vazamentos antecipados para a mídia, para criar um drama televisionado de um ex-presidente que aparece como criminoso em todas as principais redes noticiosas.
De volta à evidência: a evidência documental consiste em comunicações internas da OAS indicando que algumas pessoas dentro da empresa achavam que o apartamento triplex estava sendo remodelado para Lula. Supondo que essas comunicações são genuínas (não temos como saber), no máximo isso indica que a OAS pode ter pretendido dar a Lula um presente de um apartamento remodelado a um preço bastante inferior ao seu valor de mercado.
Mas não há provas de que Lula ou sua esposa tenham aceitado o presente alegado ou tenham feito algum esforço para obtê-lo. Pelo contrário, há evidências muito fortes de que não o fizeram. Eles nunca compraram o apartamento e não há documentos que indiquem que eles pretendiam ou tentaram comprá-lo. E eles nunca sequer ficaram no apartamento, contradizendo claramente a teoria do “crime”, de que a OAS “deu” o apartamento a Lula mas disfarçou sua propriedade.
Vale a pena notar que a acusação de “lavagem de dinheiro” que fazia parte das manchetes mundiais, “Lula condenado por corrupção e lavagem de dinheiro”, é apenas um corolário da mesma acusação: o dinheiro é “lavado”, aceitando um apartamento em vez de dinheiro.
Parabéns para Moro e amigos para estratégias de mídia inteligentes: mais uma vez, as manchetes dão a impressão de ações criminosas em larga escala e múltiplas.
Uma vez que o apartamento triplex não terminou de ser construído até 2014, cerca de três anos depois que Lula deixou o cargo, o juiz Moro teve que se esforçar mais para convencer as pessoas de que Lula cometeu um crime.
Como nos Estados Unidos, não é um crime para um ex-funcionário público no Brasil receber presentes de empresas – veja os milhões de dólares que Hillary Clinton recebeu de Wall Street. Então, o juiz teve que achar que o “presente” do apartamento do qual Lula desfrutou era suborno.
A única “evidência” para essa conexão vem do testemunho do condenado Leo Pinheiro [ex-diretor da OAS].
[…]
Esse tipo de matéria está se tornando cada vez mais comum na imprensa internacional. E já influencia gravemente o Comitê de Direitos Humanos da ONU ante a flagrante violação dos direitos de Lula, pois trancafiar um septuagenário em uma cela infecta pelo resto da vida sem que esse homem tenha sua culpa inapelavelmente provada é um ato digno das ditaduras mais sanguinárias do mundo.
A direita brasileira não conhece a reputação de Lula mundo afora. Reportagem absolutamente isenta do Huffpost mostra como o ex-presidente é visto fora do Brasil. No exterior, na imprensa internacional todos reconhecem a grandiosidade de  sua obra como presidente da República. Vale ler.
Travis Waldron 
A condenação do ex-presidente Lula da Silva é um lembrete de que a crise do Brasil – que pode até levar a um Trump brasileiro – tem implicações globais. O maior poder não-nuclear do mundo e a quarta maior democracia está em meio a uma crise política que parece que não vai terminar.
Nos últimos três anos, o crescente escândalo de corrupção do Brasil envolveu centenas de políticos. A presidente Dilma Rousseff foi acusada no último outono e na quarta-feira passada os problemas do Brasil pioraram: um juiz federal condenou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por corrupção e lavagem de dinheiro.
A condenação e o encarceramento potencial de um ex-presidente, especialmente um candidato líder nas pesquisas para as eleições presidenciais do próximo ano, levará o Brasil ainda mais à crise. Mas também deve causar preocupação no resto do mundo. Sem um Brasil estável, será difícil – talvez impossível – resolver os problemas internacionais mais urgentes do planeta.
“O mundo precisa do Brasil”, disse Mark Langevin, chefe do Brazil Institute at George Washington University’s Elliott School of International Affairs.
O maior recurso natural do país, a floresta amazônica, é crucial na luta global contra a mudança climática e o debate sobre como protegê-la continua no Brasil.
O presidente Michel Temer, atualmente, está empurrando uma legislação que remova as proteções de uma área da Amazônia do tamanho de Portugal. E depois de anos de progresso substancial cortando as emissões de gases de efeito estufa durante a era Lula, essas emissões aumentaram nos últimos anos.
O Brasil também está no bom caminho para se tornar o maior exportador de alimentos e produtos agrícolas na próxima década. É o lar de quase um quinto da água doce disponível no mundo e está entre os principais produtores de biocombustíveis sustentáveis, o que significa que o país está posicionado para ajudar a enfrentar os efeitos potenciais das mudanças climáticas – incluindo a escassez de alimentos e água em certas partes do mundo.
As fortes relações do Brasil com a China e a melhoria das relações com outras potências mundiais – incluindo os EUA, a Rússia e a União Européia – também permitem que ele se envolva em “um grande ato de equilíbrio” entre nações, disse Langevin.
“Você não pode ter uma discussão séria sobre as mudanças climáticas, a sustentabilidade, a segurança alimentar, se o Brasil não estiver na mesa”, disse Paulo Sotero, diretor do Brazil Institute at the Woodrow Wilson International Center for Scholars, a Washington-based think tank.
Mas, acrescentou, “o Brasil que tem que estar à mesa é um Brasil crível, um Brasil que está gerenciando sua economia de maneira apropriada”.
Ai que está o problema. Agora, o assento do Brasil na mesa geralmente aparece desocupado.
O escândalo de corrupção é uma grande razão para isso. Da Silva – popularmente conhecido como “Lula” – não é o primeiro, nem será o último político a sucumbir à Operação Lava Jato, a expansiva operação anticorrupção que começou como uma simples investigação sobre lavagem de dinheiro em 2014, mas, desde então, cresceu e se tornou “O maior escândalo político do mundo”.
Temer, atual presidente do Brasil, também está enfrentando acusações de corrupção e suborno que poderiam desencadear processos de impeachment no Congresso e seus críticos alegam que seu apoio à lei de desmatamento amazônico é uma manobra para ganhar o apoio de atores influentes em uma batalha para salvar seu emprego.
O Brasil tem dificuldades em lidar com as mudanças climáticas, alguns observadores aconselharam até que Temer não criticasse efetivamente o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, por tirar os Estados Unidos do acordo climático de Paris.
Essas mesmas alegações de suborno quase fizeram com que Temer ignorasse a cúpula do G-20 deste mês em Hamburgo, na Alemanha. Uma vez que finalmente decidiu participar, foi em grande parte uma reflexão tardia: ele não realizou uma única reunião de porta fechada com outro chefe de estado (o ministro das Finanças, Henrique Meirelles, foi a dois em seu lugar) e, talvez por causa dificuldade de decidir se ia mesmo participar da conferência, Temer viu seu nome omitido no programa de imprensa que listava outros líderes estrangeiros. Quando falou, insistiu que o Brasil não estava realmente enfrentando uma crise econômica.
Para muitos brasileiros, Lula pareceu ser a solução para muitos problemas do país. Ele foi talvez o presidente eleito mais transformador da história brasileira: um ex-líder trabalhista com pouca educação formal que se tornou o primeiro presidente da classe trabalhadora do Brasil. Um membro do Partido dos Trabalhadores, de esquerda, Lula, promulgou políticas sociais e econômicas que ajudaram a distribuir os ganhos econômicos da nação para pessoas com origens desfavorecidas semelhantes às suas.
O Brasil de Lula retirou cerca de 30 milhões de pessoas da pobreza. Suas políticas expansivas de bem-estar social ajudaram à remover o Brasil do mapa da fome mundial das Nações Unidas. O Brasil experimentou vastos avanços em alfabetização, educação e saúde pública, enquanto as políticas de ação afirmativa inspiradas nas da Dinamarca trouxeram brasileiros e mulheres negras para cargos de poder que nunca ocuparam.
A popularidade de Lula diminuiu em relação à aprovação astronomicamente alta de que desfrutava quando deixou o cargo de presidente, mas ele ainda está entre os políticos mais populares em um país onde políticos populares são escassos.
Uma pesquisa realizada no final de junho, antes de sua condenação, mostrou que ele era favorito para ganhar a presidência novamente em 2018. Sua condenação, no entanto, pode impedir que seja eleito, de uma vez que a lei brasileira proíbe os políticos condenados de ocupar cargos públicos.
Lula prometeu concorrer de qualquer maneira. Após a condenação, ele se chamou de “vítima de uma mentira” e disse “apenas o povo brasileiro tem o direito de decretar meu fim”. Mas se um tribunal de apelação confirmar a condenação e ele for impedido de concorrer, a corrida eleitoral de 2018 pode se tornar um assunto em aberto.
Isso preocupa especialistas políticos brasileiros. “A ausência de Lula na corrida eleitoral poderia abrir espaço para qualquer número de candidatos e as crises políticas e econômicas em dueto poderiam criar no povo a tentação de confiar em um político completamente desprevenido”, disse Sotero.
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