domingo, 18 de janeiro de 2015

Vamos importar do Nordeste uma solução para a falta de água em São Paulo.

cisterna

Atualmente os paulistas convivem com uma estranha e desconfortável situação. As tão esperadas chuvas de verão vieram, mas à custa de ruas alagadas, semáforos quebrados e centenas de árvores derrubadas, principalmente na região metropolitana da capital. Os mananciais, entretanto, continuam com seus estoques de água abaixo das cotas mais confortáveis para o abastecimento. Os níveis dos sistemas Cantareira e Alto Tietê, no máximo, estancaram as quedas no volume de água.
Pela primeira vez o governador Geraldo Alckmin admitiu, nesta semana, que São Paulo vive um racionamento de água desde o ano passado. Já o novo presidente da Companhia de Saneamento Básico de São Paulo (Sabesp), Jerson Kelman, em sua posse no início de janeiro, reconheceu que a coisa está feia: “Seria irresponsabilidade, no quadro em que a gente está hoje, olhar para frente com otimismo. Temos que estar preparados para o pior”. E emendou: “Inescapavelmente teremos algum tipo de sofrimento pela população”.
Se não é possível contar com os governantes para ter água em casa está na hora do cidadão se virar como pode. Uma solução – ou um paliativo eficiente e de baixo custo para a crise hídrica – pode estar em uma velha conhecida do povo nordestino, calejado com os longos períodos de estiagem que castigam a região do semiárido: a cisterna.
Nada mais é que um reservatório domiciliar que capta e armazena as águas das chuvas. Nas cidades do sertão nordestino castigadas pela falta das chuvas elas são a salvação da lavoura para o abastecimento diário de muitas famílias.
Tanto que, em tempos de mudanças climáticas, outras regiões já estão adotando o uso de grandes cisternas coletivas. É o caso de Mato Grosso, Bahia e do norte de Minas Gerais.
O governo federal também tem financiado a construção de reservatórios por meio do programa “Água para todos”, do Ministério da Integração Social.
O balanço dá conta de que no período entre 2011 e 2014 mais de R$ 6 bilhões foram investidos na instalação de cerca de 750 mil cisternas em 1 200 municípios do Norte e Nordeste. Nada menos que cinco milhões de pessoas foram beneficiadas.
Imagine quanta água poderia ser aproveitada nas residências do Sudeste com as chuvas que estão desabando sobre a região nas últimas semanas e não conseguem encher os mananciais?
Na capital paulista existe um grupo independente cuja missão é difundir a ideia de recolher, tratar e utilizar as águas que caem do céu: o Movimento Cisterna Já. Ele foi criado por ativistas preocupados em disseminar ações sustentáveis e humanizadoras entre os moradores das grandes cidades.
Montar e instalar minicisternas residenciais não requer muito dinheiro, nem tampouco habilidade para quem já é iniciado em pequenos consertos domésticos. Nem ao menos ocupa espaço no quintal ou na área de serviço. Para começar, são necessários itens simples encontrados em qualquer casa de material de construção: bombonas de plástico, tubos de PVC, peneiras, filtros, torneiras e um punhado de cloro.
Com tudo instalado em casa, a água das chuvas recolhida pelo equipamento – diretamente das calhas do telhado – servirá para fazer a faxina geral domiciliar, lavar o carro, dar descarga no vaso sanitário e também para molhar as plantas.
Todas estas tarefas representam a metade do que é gasto de água mensalmente em uma residência. A água das chuvas captada só não é recomendada para beber, mesmo com a adição de cloro e com os filtros.
O site do Movimento Cisterna Já disponibiliza um manual de montagem e instalação de minicisternas residenciais. Elaborado pelo engenheiro Edson Urbano, o passo a passo é detalhado e fácil de entender.
A página também indica onde encontrar bombonas à venda em São Paulo, traz reportagens e uma galeria de vídeos. O Cisterna Já também ministra oficinas, cursos e mutirões para quem quer aprender a instalar os reservatórios de captação de água pluvial na capital paulista. As datas dos próximos eventos são atualizadas no site do movimento.

cisterna - esquema


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E se em vez dos pobres o alvo do esculacho fossem os ricos ? por Nathali Macedo.

Lots of money
Lots of money.

Todo rico tem alguma coisa da qual se orgulhar, seja real ou imaginária. O rico mantém uma obrigação de ser impreterivelmente melhor que todo mundo, inclusive que os outros ricos (porque melhor que os pobres ele já se considera, mesmo que não tenha um pingo de educação e bom senso).
O rico adora bajular os filhos, não importa o quão ruins eles sejam. O garoto é viciado em cocoaína e vai à faculdade uma vez por semana, mas a mãe faz questão de gritar, a plenos pulmões, pra toda e qualquer pessoa que se aproxime (especialmente para aquelas que não estão interessadas em ouví-la): “Ele vai se formar em medicina!”
Mesmo que o garoto faça racha com o carro do papai, passe as noitadas pedindo “a bebida que pisca” e agregando valor aos camarotes da vida, não saiba absolutamente nada sobre qualquer assunto (exceto sobre como gastar dinheiro), ele é um garoto de ouro, porque ter um garoto de ouro na família é sensacional.
Porque, para o rico, o importante é ser bem visto. É patético como ele vive em um teatro vinte e quatro horas por dia: ele sabe que o filho é um viciado, a filha é uma mimada burra e sem personalidade, o casamento vai mal e a família está em crise – e todas as outras pessoas ao redor também o sabem – mas passar a imagem de que tem uma vida perfeita é sua prioridade absoluta. Eles fingem que são felizes e os outros ricos infelizes fingem que acreditam.
Por isso o rico – especialmente aquele à beira da falência – não aceita não poder ter alguma coisa que o outro rico tem. É quase uma ofensa pessoal. Então, a mulher rica que é um pouco menos rica que a melhor amiga tem que ter uma jóia tão valiosa quanto a dela, mesmo que a reforma na casa seja adiada ou que precise parcelar. O rico precisa comprar um carro do ano para que continue se sentindo rico, mesmo que seu carro esteja funcionando perfeitamente.
O rico tem um discurso antidrogas patético. “Maconheiro” é a maior das ofensas para o rico, que dorme com uísque cawboy e acorda com rivotril – por isso rico é o bicho mais hipócrita que eu conheço. E adivinha quem são os maconheiros? Os universitários, os professores revolucionários, os “vândalos que destroem o patrimônio alheio”. O filho viciado em cocaína, ao contrário, é um cidadão de bem. E esse discurso – assim como todos os outros igualmente patéticos – não tem qualquer embasamento teórico. Por isso para um rico, todas as drogas têm igual efeito (menos as drogas lícitas, é claro): o de tornar as pessoas indesejáveis. E só.
Uma cultura incompreensível da classe A é a de ser mal-educado. Parece que você só faz parte efetivamente do distinto grupo das pessoas ricas se você desprezar o pobre e tudo o que lhe diz respeito, arrotar aos quatro ventos que você é melhor que o outro. Por isso aqueles filhos de ricos que resolvem fazer de conta que não se consideram melhores do que os outros – e são eventualmente de esquerda pra disfarçar o nojento ódio de classe impregnado em seus poros – são os garotos-problema das famílias ricas. Perdoa-se o filho usuário de cocaína, o que faz racha com o carro do papai, o que engravida a filha da empregada e viaja pra fora do Brasil pra não assumir – mas o que se mistura com os pobres é quase sempre renegado. “Vamos, tesouro, não se misture com essa gentalha!”
E, para a minha diversão, o filho do rico persiste naquele comportamento que irrita seus pais só pra se divertir um pouco naquela vida monótona em que nada mais é novidade. Alguém me traz uma pipoca?
O rico faz questão de parecer abastado culturalmente, mas em geral não o é. Preferiu fazer três viagens para a Disney do que conhecer os museus europeus ou as belezas naturais do Brasil. Diz que fala quatro línguas mas provavelmente não entende sequer a língua portuguesa e, geralmente, não se pode conversar com um rico sobre a situação política do país porque ele só sabe falar sobre corrupção. “São todos corruptos” é o seu bordão predileto para esconder a sua completa ignorância política.
O rico vai ao cinema assistir filmes hollywoodianos e reproduz as críticas cinematográficas que lê na internet para parecer inteligente, mas não faz idéia de quem seja Quentin Tarantino – e, quando faz, exclama agudamente: “Um horror, tem muito sangue! Por isso não gosto.”
Como todo bom perfeccionista, o rico precisa estar impecável em todos os momentos da vida. Botox, dieta dunkan, drenagem linfática, implante capilar e cirurgia íntima: Tudo precisa estar perfeito. E o mais curioso é que, em geral, eles permanecem feios mesmo depois de gastarem rios de dinheiro. Só que feios com a cara esticada e sem manchas.
O rico é aficionado por ostentação – mesmo que negue categoricamente, porque, para ele, ostentar é coisa de pobre que ouve rap. Ele acha ridículos aqueles clips em que os rappars jogam dinheiro pro ar e passeiam em carros rebaixados, mas acham o máximo contar para todo mundo que gastaram meio milhão de reais na festa de casamento do sobrinho ou que passaram férias na Europa. Ah, antes que eu esqueça, as fotos dos ricos nas redes sociais são sempre em alguma viagem internacional que fizeram: afinal, todos devem saber que eles são ricos e viajam para fora do país.
Pode ser uma foto em frente à torre Eiffel, ou na neve com uma toquinha de frio charmosa, ou em frente a um teleférico ou em um café francês. O importante é que a foto não tenha sido tirada em território brasileiro, porque até ser brasileiro é coisa de pobre pra ele. E por isso mesmo o rico adora tudo o que é internacional: perfumes, viagens, bebidas, línguas, pessoas.
E por isso mesmo ele adora expressões em línguas estrangeiras. Legendas em inglês, tatuagens em inglês e até conversas em inglês. Expressões francesas, costumes gringos, tudo isso é absolutamente chique para o rico. O zelador vira “Concierge”, a mercearia vira “delicatéssen”, o motorista vira Chofer, o cardápio vira Menu. Porque o rico, na verdade, despreza totalmente o português porque, se é de fora do país, é claro que é de bom gosto.
E o principal: o rico adora ser manchete, por isso alguns talvez amem esse texto, mas saiam por aí dizendo: “eu vejo como uma inveja!”
Realmente. Como são felizes. Babo de inveja.

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O dia em que o MPL provocou HADDAD e tomou bomba de graça da PM de Alckmin; um relato.

Os homens em ação
Os homens em ação.

Compareci, nesta sexta-feira (16), ao 2º Grande Ato do Movimento Passe Livre contra o aumento das passagens de ônibus e de metrô em 2014. O protesto estava marcado para as 17hrs, mas cheguei a passar pela Praça do Ciclista, no fim da Avenida Paulista, horas antes, entre 15hrs e 16hrs.
Não havia nem 10 pessoas no local marcado para começar a marcha, mas já rodavam viaturas da Polícia Militar cruzando a rua para se alocar nas laterais, na Rua Bela Cintra. Amigos me avisaram pelas redes sociais que outros veículos da polícia rondavam a Sé. As autoridades vieram ainda mais preparadas para este protesto. Se antes foram estimados cerca de 800 policiais, eu acredito ter visto mil efetivos colados na manifestação, além de helicópteros e viaturas de suporte.
O protesto começou às 17hrs completamente frágil, pouco concentrado e fraco. A Praça do Ciclista é um péssimo local para reunião de grupos. À frente da estátua do herói venezuelano Francisco de Miranda há uma sacada circular com uma visão do túnel que liga a Paulista com a Rebolças e a Doutor Arnaldo. Por isso, o grupo ficou espalhado e pouco concentrado, no mesmo tempo em que a Tropa de Choque se concentrou do lado da Paulista e mais PMs se aglomeraram na Consolação.
Naquele momento, o MPL deveria fazer uma assembléia pública para decidir o trajeto. Mas o medo da reação da polícia e a pouca concentração de pessoas atrasaram tudo, embora as baterias dos coletivos de partidos políticos e de movimentos sociais batessem com força. Eu decidi, então, passar o cordão do Choque e ver quantos policiais estavam na Avenida Paulista.
Black bloc na rua
Black bloc na rua.
Vi algo surreal perto do Haddock Lobo: além dos microônibus e dos carros da Tropa de Choque, havia policiais militares encapuzados com armas que certamente não eram de balas de borracha. Pareciam fuzis de relance. Estavam protegendo lojas de conveniência e até o restaurante América naquele local.
Voltei para o protesto. O MPL decidiu rapidamente que seria impossível passar a barreira do Choque e ir em direção à Paulista. Mudou a rota e decidiu descer a Consolação, passando pelo mesmo lugar em que fomos encurralados na Rua Matias Aires, entre outras vias.
O começo da caminhada foi lento. Um grupo de black blocs derrubou uma cabine da PM no final da Paulista. Achávamos que aquilo causaria um confronto com a polícia, acabando com o protesto ali mesmo. As autoridades correram para filmar o grupo, mas não puxaram o Choque para reagir.
A PM chegou a afirmar em seu Twitter que apreendeu supostas garrafas de gasolina de manifestantes. A corporação se retratou minutos, dizendo não saber o real conteúdo do recipiente. E seguiu postando nas redes sociais a sua visão sobre o que ocorreu.
O protesto foi aumentando de tamanho. De cerca de mil pessoas na Paulista, foram concentrando cinco mil na Consolação progressivamente. Mesmo assim, as pessoas se mantiveram na faixa de decida, sem entrar na contramão. Algumas poucas pessoas foram para a outra pista. Uma senhora, por exemplo, começou a berrar para os ônibus que subiam a Consolação. “É um absurdo pagar 3,50!”. Em resposta, um motoqueiro soltou: “Parem de ficar defendendo o PT!”.
A manifestação passou a estação de metrô Paulista, ultrapassou a Matias Aires e ia em direção ao Mackenzie. Lá estourou a primeira bomba de efeito moral. O Movimento Passe Livre segurou o protesto e conteve os black blocs, mesmo diante da polícia. Não aconteceu quebra-pau, ninguém se inspirou e resolveu apedrejar bancos. Por isso o protesto seguiu.
O clima acalmou tanto que eu vi um senhor passeando com dois cachorros no meio do protesto. Os black blocs andaram perto do MPL, sem pegar pedras e nem ameaçar ninguém. Chegamos ao centro pouco antes das 20hrs. Passamos pela biblioteca Mario de Andrade e pela estação Anhangabaú de metrô. Naquele trecho, vi o Movimento Passe Livre negociando com a Tropa de Choque ao longo do percurso, para evitar reações violentas. E a polícia procurou manter a calma, embora dois policiais arrumaram briga com dois roqueiros bêbados que trombaram com eles próximo dali. Rumamos para o Teatro Municipal.
Amigos meus e jornalistas acharam que as bombas e as balas de borracha iriam voar assim que chegássemos na Prefeitura de São Paulo. Misteriosamente, a PM apenas se posicionou na frente do local e permitiu a passagem do protesto. Manifestantes e imprensa ficaram felizes pela ausência de repressão até ali. O MPL resolveu então fazer uma provocação com o prefeito Fernando Haddad. Apontou uma luz em direção à Prefeitura com os seguintes dizeres: “Je Suis Catraca”. Na imagem de fundo, estava o próprio prefeito. O que o MPL queria dizer era que o petista Haddad também é conivente com o aumento das passagens, não criticando apenas o tucano Geraldo Alckmin.
Integrantes do MPL voltaram a se reunir com a PM na frente da prefeitura. Conversei com Eudes Cassio do Movimento Passe Livre. “Estou tentando negociar com a polícia para que o protesto prossiga até a Secretaria de Transportes”, ele me explicou.
Eu fui para a lateral da prefeitura, perto de alguns fotojornalistas que se sentavam para transferir imagens do protesto pacífico até aquele momento. Aconteceu então algo que nem a própria Polícia Militar explicou nas redes sociais. Do nada começaram a ser disparadas quatro bombas na frente da prefeitura. Notando a movimentação, resolvi correr, porque vieram em seguida as balas de borracha. Logo depois, consegui ouvir fogos de artifício. Foram disparados pelos manifestantes, mas só depois do ataque da PM.
O problema é que eu corri pela lateral, por trás da Tropa de Choque, e dei de cara com a Cavalaria, que fez como se fosse avançar pra cima do grupo de jornalistas. Berrei e bati no topo do capacete de skatista que comprei para não levar balas no crânio, que estava identificado com os dizeres de imprensa. Eles hesitaram, pararam e deixaram a gente passar. Na frente da prefeitura, as pessoas começaram a correr de medo.
Uma amiga tentou fugir pela estação Anhangabaú. Foi separada de suas companhias porque o metrô fechou a entrada antes que ela pudesse correr. Só conseguiu fugir pela Consolação. Outra garota levou spray de pimenta no rosto depois de desmaiar.
Os black blocs, quietos até então, se sentiram livres para depredar e revidar o ataque espontâneo da Polícia Militar, que usou até munição química no ataque. Derrubaram um orelhão, a Caixa Econômica da Rua Líbero Badaró, uma unidade do Banco do Brasil na Xavier de Toledo e um CitiBank da Rua São João.
Atacados pelo gás e pelas balas de borracha, manifestantes tentaram descer a Anhangabaú e foram agredidos por PMs que circundavam a área embaixo. Os que correram até o Teatro Municipal encontraram outra barricada do Choque e mais bombas. A manifestação se dispersou completamente.
Eu corri por fora, através do Largo de São Francisco, até o começo da Brigadeiro Luís Antônio. Exausto e na companhia de outra jornalista, entrei com sede num posto BR para beber alguma coisa. Antes disso, vi a bateria de militantes do PSOL voltando do protesto. Uma menina entre eles tossia muito e passava mal pelos efeitos do gás lacrimogêneo. Outras pessoas andavam em pequenos grupos para evitar agressões com a PM.
O Choque então apareceu com lanternas procurando manifestantes na rua. Um amigo meu, fotógrafo freelancer, voltou até o Teatro Municipal para ver como ficou o local após o protesto. Foi recebido com bombas, sendo que tinha acabado de tirar o seu capacete com os dizeres de imprensa para se proteger.
Fui embora pela estação República, que estava sendo vigiada por um cordão de seguranças particulares da Linha Amarela, privatizada por Alckmin. Desviei deles e rumei pra zona norte de São Paulo. E um protesto que tinha tudo pra ser pacífico terminou em tiro, porrada e bomba. Sem que eu entenda até agora os reais motivos por trás disso.
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