quarta-feira, 31 de outubro de 2018

Mais de 140 jornalistas ameaçados no Brasil - A Abraji organizou uma lista que reúne diversos casos de agressão e intimidação, incluindo as ameaças sofridas pela repórter da Folha de São Paulo que revelou a rede disseminação de notícias falsas a favor de Bolsonaro financiada ilegalmente por empresários. O documento foi apresentado como denúncia à OEA, por iniciativa da Fenaj

 


Ao menos 141 jornalistas foram ameaçados ou agredidos na campanha eleitoral para as eleições presidenciais do próximo domingo, a qual foi dominada pela violência promovida pelos grupos de choque vinculados direta ou indiretamente ao candidato (e agora presidente eleito) Jair Bolsonaro. Uma missão de observadores da Organização dos Estados Americanos (OEA) foi informada sobre a violência contra os trabalhadores de imprensa, um tema que foi denunciado pela Federação Nacional de Jornalistas (Fenaj).

A Associação Brasileira de Periodismo de Investigação (Abraji) organizou uma lista que reúne diversos casos de agressões e intimidações, como o que envolveu a repórter do jornal Folha de São Paulo autora da reportagem que revelou uma rede de disseminação de notícias falsas via redes sociais, e que foi financiada ilegalmente por empresários apoiadores da campanha de Bolsonaro. “Pretendemos levar (a denúncia) aos relatores encarregados de assuntos referentes à liberdade de expressão, tanto na Organização dos Estados Americanos (OEA) quanto na Organização das Nações Unidas (ONU)”, declarou a gerente executiva da Abraji, Marina Iemini Atoji.

A ex-presidenta de Costa Rica, Laura Chinchilla, que encabeçou a missão da OEA responsável pela observação do processo eleitoral brasileiro, expressou sua preocupação pela violência e considerou que o Brasil é um caso inédito, pela magnitude do bombardeio com fake news para aturdir os eleitores. “Este tipo de ataque de desinformação, sobretudo através do WhatsApp, não tem precedentes no mundo”, afirmou Chinchilla, que se reuniu em Brasília com autoridades da Procuradoria Geral da República (PGR) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

“A Abraji está em contato com a missão de observadores da OEA, para a qual mostramos um panorama sobre a situação”, contou Iemini Atoji. Consultada sobre se a campanha concluída neste segundo turno foi a mais violenta dos últimos anos, a gerente respondeu que “pelo menos foi uma das mais intensas em matéria de intimidações à imprensa”, e citou que a maioria dos casos desse tipo se deram através das redes sociais. Em um princípio, agregou a jornalista, “não é possível afirmar categoricamente que foram as piores eleições (em matéria de violência) porque faltariam números para servir de parâmetro de comparação, mas deve-se destacar que os ataques no ambiente digital foram muitos, com alto nível de agressividade. Se trata de um fenômeno novo, que tem uma característica muito específica, já que são difusos e massivos, além de pouco previsíveis e de difícil contenção”.

Entre os episódios mais impactantes está o caso da jornalista Patrícia Campos Mello, da Folha de São Paulo, que publicou uma reportagem de grande repercussão sobre o esquema de fake news montado por aliados de Bolsonaro e financiado de forma ilegal. “Representantes do diário Folha afirmaram que Patrícia conta com todo o suporte de segurança jurídica, digital e física, a partir da avaliação do risco ao qual ela pode estar exposta”. explicou Iemini Atoji – que acrescentou também que “de acordo com informações dadas pela própria Folha, a jornalista continua trabalhando normalmente, apesar da situação”. Contudo, “o mais preocupante é a situação dos profissionais que são vítimas de ataques e trabalham em meios mais modestos, e dos jornalistas independentes, que não têm estrutura para se proteger dos ataques”, explicou.

As repetidas ameaças a jornalistas também foram motivo de denúncias por parte de organizações Repórteres Sem Fronteiras, Humans Right Watch e a Federação Nacional de Jornalistas. Até mesmo o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) se manifestou sobre o tema. “As intimidações a pessoas, a diários ou a quem quer que seja são inadmissíveis, repudio com energia as ameaças à Folha e aos seus jornalistas”, afirmou o líder histórico do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB).

O ministro de Segurança Pública, Raul Jungmann, anunciou que abrirá uma investigação sobre as agressões a Patrícia Campos Mello. O caso da intimidação contra a jornalista também deve incluir os ataques do próprio presidente eleito, enquanto ainda candidato, quando prometeu que, se eleito (como foi neste domingo), seu governo não dará publicidade oficial ao diário Folha.

*Publicado originalmente no Página/12 | Tradução de Victor Farinelli

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