quinta-feira, 20 de junho de 2013

O ESPECTRO DE UMA NOVA '5ª FEIRA NEGRA' NOS RONDA.

Autoridades, políticos, jornalistas, sociólogos chutam em todas as direções, na tentativa de interpretar o novo fenômeno: um despretensioso protesto contra o aumento das tarifas do transporte coletivo em São Paulo inspirou manifestações semelhantes em outras 11 capitais, levou às ruas centenas de milhares de cidadãos e comprovou dramaticamente que o autoritarismo continua bem vivo nos aparatos de segurança pública, 28 anos depois de finda a ditadura militar. 

Desde o Fora Collor!, em 1992, não se via algo assim. E, como a bandeira dos manifestantes não é única –vai desde as maracutaias da Copa até o descaso com a Saúde e a Educação, passando por muitas outras mazelas de nossa democracia imperfeita--, também não vai ser uma única medida que fará cessar os protestos.

Eles começaram e não têm data para acabar; se os governantes não fizerem algumas concessões plausíveis (depois da orgia de gastos do Mundial, soam ridículas as dificuldades alegadas para não subsidiarem algumas tarifas...), talvez perdurem até a exaustão e sejam retomados tão logo um novo acontecimento marcante o justificar. Era assim em 1968.


Também naquele tempo os objetivos explícitos eram um tanto frouxos, como a recusa dos tecnicizantes acordos MEC-Usaid –realmente perniciosos, mas cujos efeitos ainda não se faziam sentir. Noves fora, o que irmanava estudantes de todo o País era a rejeição de um espantalho bem conhecido, e não apenas adivinhado: a própria ditadura e sua bestial repressão.

Tudo começou no final de março, quando a PM invadiu um restaurante universitário do Rio de Janeiro em que os estudantes faziam um tímido protesto contra o aumento do preço das refeições. O estúpido assassinato do secundarista Edson Luís de Lima Souto indignou o País, motivando manifestações de protesto em várias cidades. O movimento estudantil, que a ditadura sufocava desde 1964 e cuja primeira tentativa de voltar às rua (as setembradas de 1967) havia sido reprimida a ferro e fogo, renascia espetacularmente.

No restante do ano, até a assinatura do Ato Institucional nº 5, houve uma disputa acirrada pelos corações e mentes dos brasileiros: ora a violência policial gerava enorme repulsa e dava ensejo a momentos magníficos como a passeata dos 100 mil, ora os excessos dos manifestantes (muitas vezes insuflados por provocadores de direita, como tudo leva a crer que esteja se repetindo na atualidade) forneciam munição valiosa para a imprensa desqualificar os protestos.

PROVOCADORES A POSTOS.


Agora, essa gangorra voltou com tudo: como a mídia satanizou as três primeiras manifestações do Movimento Passe Livre em São Paulo, a PM sentiu firmeza para atuar no centro da cidade com a mesma brutalidade a que submete habitualmente os moradores da periferia.

Já os manifestantes, ressabiados com a repercussão negativa de até então, esforçavam-se para conter a violência, com êxito. Aí, sem quê nem pra quê, uns 20 brutamontes da tropa de choque iniciaram os espancamentos e os disparos de balas de borracha a esmo, abrindo as portas do inferno.

As imagens da 5ª feira negra inundaram as redes sociais e correram o mundo; de tão chocantes, obrigaram a grande imprensa a destacar o outro lado que até então vinha escamoteando. O que mais poderia fazer, depois de seus profissionais também serem rudemente atingidos?


À selvageria fardada, em SP e no RJ, seguiu-se a omissão matreira dos policiais que, como se fossem crianças emburradas, simplesmente deixaram de cumprir sua missão legítima como retaliação aos que criticaram suas ações ilegítimas. 

Além, é claro, do mais do que provável incitamento de saques e depredações por parte de agentes infiltrados, com a também óbvia instrumentalização da ralé urbana que a polícia controla a bel-prazer.

Resta saber se as forças da ordem –que até agora têm sido mais agentes da desordem institucionalizada— encontrarão o equilíbrio, nem se omitindo nem barbarizando, ou vão simplesmente partir para a vingança.

O espectro de uma nova 5ª feira negra nos ronda.


AS PEDRAS VOLTAM A ROLAR.



É com imensa emoção que vejo as pedras recomeçando a rolar. 

Muitos não perceberam, mas, em tudo e por tudo, o momento atual lembra 1968. 

Foi o ano que praticamente definiu minha vida: ao longo dele, passei de jovem indignado a revolucionário convicto, que jamais deixaria de ser.

Depois da luta armada, do calvário nos cárceres da ditadura, das comunidades alternativas em que tentamos por uns tempos perpetuar o sonho já banido das ruas, só nos restou --a mim e aos melhores da minha geração-- reassumir a insossa luta pela sobrevivência e ficar à espera da nova primavera que, sabíamos, um dia viria. Pois os seres humanos não conseguem viver eternamente sem esperança, compaixão e solidariedade.



E, como costuma acontecer nos processos revolucionários, a retomada começa no ponto mais alto atingido pela última maré revolucionária, mesmo havendo entre ambas um hiato de 45 anos.

Com a diferença que o mundo hoje está muito mais amadurecido para as grandes transformações, que tendem, inclusive, a representar a diferença entre a sobrevivência e a extinção da humanidade; cada vez mais se evidencia que, só unidos e priorizando o bem comum conseguiremos nos safar da grave crise econômica e das gravíssimas consequências dos desequilíbrios ecológicos, que desabarão sobre nós nas próximas décadas.

A juventude está despertando na hora certa! 

E nós, aqueles que nunca dissemos que a canção estava perdida, sobrevivemos física e moralmente para, ao lado dela, tentarmos outra vez.

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