quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Gestão de Aécio em Minas pode resultar em 78 mil demissões.

 Professores de Minas em greve pelo nacional (9/6/2011). Foto: Fonte: SInd-UTE/MG

Nesta terça (12), os trabalhadores da educação de Minas Gerais paralisam suas atividades para cobrar do governo do Estado uma solução para o desemprego iminente de cerca 78 mil trabalhadores da categoria. São diretores de escolas, professores, cantineiros, vigilantes e auxiliares de serviços gerais que, há 7 anos, foram efetivados como servidores estaduais sem concurso público pela Lei 100/2007, do então governador Aécio Neves.

Em março, a Lei 100/2007 foi declarada inconstitucional pelo do Supremo Tribunal Federal (STF), que só publicou agora, em 31 de julho, o acórdão final. Na semana passada, o governo de Minas entrou com embargos declaratórios, uma espécie de recurso que não tem o poder de mudar a posição tomada pela corte, mas possibilita o esclarecimento de dúvidas e pontos obscuros da decisão. De qualquer forma, protela seu cumprimento, já que o novo presidente da corte, Ricardo Lewandowski, ainda terá que marcar nova sessão de julgamento para apreciá-los. E isso pode demorar.

O governo do Estado, que continua nas mãos do PSDB, conta, portanto, com a morosidade com que o STF vem tratando questões judiciais envolvendo seu partido para não ter que amargar, antes das eleições, o custo político de ver milhares dos seus potenciais eleitores desempregados devido a uma trapalhada administrativa do presidenciável que tenta vender a imagem de gestor público competente. E enquanto isso, se esquiva de responder os anseios dos demissionários que, após a decisao do STF, foram transferidos do regime previdenciário próprio do Estado, o Ipsemg, para o Regime Geral, o INSS.

"O Governo do Estado lavou as mãos e vem fazendo de tudo para protelar o cumprimento da decisão para depois das eleições. Mas os trabalhadores precisam de respostas para seus problemas concretos agora" afirma a presidenta do Sindicato Único dos Trabalhadores da Educação de Minas Gerais (Sind-UTE MG), Beatriz Cerqueira. Segundo ela, servidores que estavam em licença médica autorizada pela previdência estadual, por exemplo, foram reconvocados para o trabalho, já que, como o tempo deles de contribuição ao INSS não alcança um ano, o órgão não custeia a licença.

Além disso, a maioria teme não conseguir se aposentar com a mudança de regime. Muitos, inclusive, amargam grande prejuízo: os que acumulavam mais de um emprego e, por isso, pagavam dupla contribuição ao Estado e ao INSS, agora, só terão direito à aposentadoria pelo segundo, que paga menos. É o caso da supervisora da Escola Normal de Juiz de Fora, Gina Sarkes Machado, que atua há 17 anos no Estado. "A sensação que temos é que estamos completamente desamparados, sem ninguém para resolver nossa situação. Eu, por exemplo, vou perder 17 anos de contribuição ao Ipsemg", afirmou à Carta Maior.

Ela conta que começou a trabalhar nas escolas estaduais na segunda metade da década de 1990, logo após se formar. Como o salário era baixo, trabalhava também na rede particular e municipal. Chegou a ser aprovada em dois concursos públicos para o Estado, mas nunca foi convocada. "Todo ano eles me chamavam para trabalhar como designada, com contrato temporário, e eu ia continuando, esperando a efetivação dos concursos, que nunca vieram. Até que em 2007, com a Lei 100, prometeram que eu e outros 98 mil servidores seríamos finalmente efetivados", conta ela.

Estudante do último ano de Direito, Gina já esperava que a lei fosse declarada inconstitucional. Mas garante que esta não é a realidade da maioria dos efetivados pela Lei 100. "Muitas pessoas acreditaram nas garantias do governo, que chegou a enviar uma carta ressaltando que teríamos os mesmos direitos dos concursados", alega. Segundo a supervisora, o clima na escola é péssimo. "Além de não saber até quando teremos salário, a maioria não pode nem ficar doente, porque o INSS não concede licença antes de um ano de contribuição. Nós queremos processar o Estado por danos morais", afirma.

"Gestão temerária e eleitoreira"

Para o deputado estadual Rogério Correia (PT), um dos mais atuantes da pequena oposição ao PSDB na Assembléia de Minas Gerais, o imbróglio é resultado da gestão temerária e eleitoreira do ex-governador Aécio Neves, que usou os servidores para resolver um problema financeiro imediato dos cofres públicos.

Segundo ele, quando assumiu o governo, Aécio constatou que o Estado tinha uma enorme dívida com a previdência porque, apesar de quase 100 mil servidores da educação serem contratados de forma temporária, eles recolhiam contribuição para a previdência do Estado, e não para a do INSS, como rege a lei.

"Ao invés de quitar a dívida, passar a recolher a contribuição dos temporários para o INSS e abrir concurso público reconhecendo o tempo dos designados na contagem de pontos, Aécio preferiu enganar esses servidores e efetivá-los sem concurso público, o que é ilegal. Assim, protelou a dívida previdenciária com o governo federal, que permanece, e manteve mais dinheiro entrando nos cofres estaduais", esclareceu. Segundo o deputado, o Ministério da Previdência não divulga o valor atualizado da dívida, mas, à época da sanção da Lei 100, a estimativa era que chegva a R$ 7 bilhões.

"Chantagem eleitoral"

A presidenta do Sind-UTE MG vai mais longe. Segundo ela, tanto a gestão de Aécio (2003-2010) quanto a do também tucano Antônio Anastasia (2010-2014), que o sucedeu, criaram a lei 100 para fugir da dívida com a previdência, mas trabalham com a construção discursiva de que o Estado precisa continuar nas mãos do partido para que esses servidores tenham seus direitos assegurados, em uma espécie de chantagem permanente com o eleitorado. "Eles usam a fragilidade funcional deste pessoal para obter ganhos eleitorais. Fizeram isso em 2010 e agora voltam com o mesmo discurso", denuncia.

De acordo com a sindicalista, a "estratégia perversa e eficaz" do governo mineiro para manter seu apoio popular mesmo frente ao quadro caótico vai do controle midiático a práticas antissindicais. Em entrevista ao maior jornal do Estado, em fevereiro, a secretária de Educação, ana Lúcia Gazzola, chegou a afirmar que o Sindicato estaria contra os servidores que deveria representar. "Grande parte da mídia não escuta outros atores que não sejam os do próprio governo. Por isso, só reproduz a versão oficial que o Estado divulga", acusa.

Outro discurso reverberado durante o processo foi o de que a Adin contra a Lei 100 seria uma manobra da presidenta Dilma Rousseff que, por meio do Ministério Público Federal, tentava minar a popularidade do seu opositor no Estado. "Esse discurso chegou a ser veiculado nos emails funcionais das escolas estaduais, através de mensagem encaminhada por uma tal de Associação dos Pais e Professores de Minas Gerais (APP-MG), que não tem nenhuma representatividade e faz papel de correia de transmissão do governo do Estado", conta.

De acordo com ela, mesmo o poder judiciário, o Tribunal de Contas e o Ministério Público mineiros atuam ssitematicamente de forma coordenada com o governo. "Não tem ninguém que fiscaliza, que atue em defesa dos trabalhadores. e os poucos que dizem a verdade, como é o caso do Sindicato, acabam sofrendo forte processo de retaliação, no nosso caso de práticas antissindical", acrescenta.

O deputado Rogério Correia concorda. "Hoje mesmo o presidente da Assembleia, Dinis Pinheiro, que também é o candidato do PSDB a vice-governador do Estado, desqualificou a mobilização desta terça acusando o sindicato de pertencer ao PT. Aqui em Minas, não existe separação dos poderes. É um noecoronelismo de fazer inveja ao toninho Malvadeza", acrescentou.

O histórico do caso.

O imbróglio envolvendo os trabalhadores da educação de Minas Gerais começa muito antes do governo Aécio (2003-2010). Mais precisamente quando a Constituição de 1988 passou a exigir concurso público para ingresso no serviço público. O governo de Minas resistiu à nova norma legal e manteve a maioria de servidores com contratos temporários. E pior, recolhendo as contribuições previdenciárias deles para o Estado, o que era irregular.

Em 2000, o então governador Itamar Franco (1999-2003) tentou resolver o impasse abrindo concurso público para preenchimento das vagas na educação. Em maio de 2002, o homologou os resultados. Foi quando apareceu em cena a até então desconhecida Associação dos Professores Públicos Mineiros (APP-MG), questionando o certame, já que grande parte dos 120 mil profissionais que trabalhavam há anos para o estado via designações não haviam sido aprovada no concurso e ficariam desempregados.

Aécio Neves assumiu o governo, em 2003, com os profissionais da educação divididos. Enquanto a APP-MG promovia manifestações para resguardar os direitos dos designados que não foram aprovados no concurso, o Sindi-UTE pressionava pela aprovação dos concursados. Em outubro, chegou a convocar os primeiros aprovados no conruso para assumirem seus cargos. Mas, em dezembro, como parte da sua política que ficou conhecida como "choque de gestão", mudou as regras para designações e voltou a investir nas contratações temporárias.

O Sind-UTE MG acionou o Ministério Público, que obteve liminar judicial suspendendo a contratação de designados que não foram aprovados em concurso. Pela decisão, o governo seria obrigado a pagar R$ 10 mil por cada designado mantido nas escolas. O governo Aécio, ao invés de convocar os concursados, partiu para o ataque, via imprensa. Segundo ele, a decisão judicial deixaria 2,7 mil alunos sem aulas e colocaria a educação mineira em risco.

Em 2007, ele encaminhou à Assembleia o projeto de lei para efetivar 98 mil trabalhadores designados sem concurso público. O projeto foi aprovado e sancionado. A Procuradoria Geral da União (PGR), porém, recorreu ao STF contra a Lei 100. Em maio deste ano, a corte máxima julgou a Adin procedente. Os ministros Marco Aurélio de Mello e Joaquim Barbosa, então presidente do STF, votaram pela demissão de todos os 98 mil efetivados. A maioria, porém, seguiu o voto do relator, ministro Dias Toffoli, que estabeleceu exceções.

Pelo voto do relator, ficaram isentos dos efeitos da decisão os trabalhadores que se aposentaram no período e os que prestaram novo concurso público e foram aprovados. Aos demais, que o governo mineiro estima em 78 mil, restou a demissão. Para os servidores que ocupam cargos para os quais não há concurso público em andamento, a dispensa deve ocorrer em até um ano, para que o Estado tenha prazo para promover o certame. Para os demais, tem efeitos imediatos. Ou seja, deverá ser cumprida logo após o julgamento dos embargos.

http://www.vermelho.org.br/noticia/247516-1

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