Na Viradouro, porque ninguém é de ferro.
Todo o quiproquó de Joaquim Barbosa em torno das visitas que o ministro José Eduardo Cardoso recebeu de advogados de empreiteiros da Lava Jato serviu para várias coisas, mas, principalmente, para: 1) ele se manter à tona no noticiário depois que Sérgio Moro tomou seu lugar como paladino da esperança; 2) valorizar seu passe como palestrante.
No vácuo jornalístico do Carnaval, o ex-presidente do STF viu uma oportunidade de usar o chamado marketing pessoal. Acompanhe a cronologia.
No dia 14 de fevereiro, mandou: “Nós, brasileiros honestos, temos o direito e o dever de exigir que a Presidente Dilma demita imediatamente o Ministro da Justiça.”
Em seguida: “Reflita: vc defende alguém num processo judicial. Ao invés de usar argumentos/métodos jurídicos perante o juiz, vc vai recorrer à Política?”
Gerou o barulho esperado. A OAB acabou divulgando uma nota dizendo o que Barbosa já sabia: “O advogado possui o direito de ser recebido por autoridades de quaisquer dos poderes para tratar de assuntos relativos a defesa do interesse de seus clientes. Essa prerrogativa do advogado é essencial para o exercício do amplo direito de defesa”.
Como costuma fazer ao ser criticado, vitimizou-se. Três dias mais tarde, voltou à carga no Twitter: “Os que recorrem à política para resolver problemas na esfera judicial não buscam a Justiça. Buscam corrompê-la. É tão simples assim”. Depois: “S/ as reações aos meus posts recentes sobre confusão entre Política e Justiça: meus críticos fingem não saber que hj sou um cidadão livre.”
Ainda criticou o que definiu, em seu pedantismo, como “plumes-à-gage” — penas de aluguel. Nesse meio tempo, topou um convite para ver o desfile da Viradouro na Sapucaí. A Viradouro teve como patrono o infame Capitão Guimarães, bicheiro de Niterói, ex-oficial do Doi-Codi, mas tudo bem.
Até que veio o golpe de misericórdia: “Iniciei ciclo de palestras dedicadas ao mundo empresarial sobre aplicação e impacto da lei anticorrupção nas empresas, sobretudo as globais.”
Era isso, então?? Faltou colocar o fone de contato e o email, mas o Google resolve. De acordo com a Parlante, agência que trabalha com palestrantes de áreas variadas, Barbosa não sai da cama para subir num palco por menos de 100 mil reais. Esse é o preço de saída.
Joaquim Barbosa sabe vender seu peixe.
***
*** ***
A SURRA DE HADDAD EM VILLA E SHEHERAZADE.
Preparo e despreparo.
Só ouviria a Jovem Pan sob a mira de um revólver. Não seria a presença de Haddad na rádio que me levaria a sintonizá-la.
Não dou a minha audiência às mídias que entendo fazerem mal ao Brasil. Aproveito melhor meu tempo.
Acho quase patético que críticos da Globo, por exemplo, não saiam da emissora. Você frequentemente encontra nas redes sociais alguém que ataca o JN, e depois o jornal da noite, e depois a Globonews – e entre tudo isso a CBN.
Você contribui com o inimigo.
Mas razões jornalísticas me fizeram ouvir a gravação da entrevista com Haddad. A repercussão foi grande.
De resto, minha amiga Priscila Sérvulo me mandou o link do programa, com uma recomendação para que visse e comentasse.
Pensei comigo: vou experimentar.
Acabei vendo a entrevista toda.
Duas coisas opostas me chamaram a atenção: o preparo calmo e sereno de Haddad e o despreparo bufão dos entrevistadores Villa e Sheherazade.
De uma forma geral, foi uma coisa parecida com o Roda Viva em que Piketty passeou diante de uma bancada hostil e inepta comandada pelo economista André Lara Resende.
As más intenções da Jovem Pan apareceram antes mesmo da entrevista.
Sherezade disse que demorara duas horas para ir de casa para o trabalho. Culpa de Haddad, naturalmente.
Logo aí Haddad também mostrou suas armas. Ele quis saber de onde ela vinha, e se era assim sempre.
Pressionada, ela admitiu que em geral leva uma hora. E disse a Haddad que mora no Barueri. Fora da cidade, portanto. Se morasse em São Paulo, lembrou Haddad, ela perderia menos tempo no trânsito.
Villa foi logo abatido também.
Ele falou na taxa de reprovação de Haddad no meio do mandato como se fosse um fato novo na história dos prefeitos de São Paulo.
Haddad disse a ele que, como historiador, ele deveria consultar o passado. Marta e Kassab passaram por situações semelhantes, e logo depois de aumentar a tarifa dos ônibus, como ele próprio.
Haddad mostrou a relação entre aumento de tarifa e popularidade do prefeito.
Pego de surpresa, tudo que Villa conseguiu dizer é que iria pesquisar o assunto.
Isso quer dizer o seguinte: ele não fez a lição de casa.
Segundo algumas versões, Patrícia Poeta foi afastada do JN por supostamente não ter se preparado convenientemente para a entrevista com Marina Silva.
Um editor rigoroso afastaria Villa, mas imagino que isso não vá acontecer por uma razão: espera-se dele, apenas, que fale mal continuamente do PT, e não que se prepare para entrevistas. E ele entrega – em sua maneira caricatural, confusa e frequentemente imbecil — o que esperam dele.
Numa de suas grandes frases, Euclides da Cunha, ao tratar de Floriano Peixoto, disse que ele chegara à presidência não porque se elevara, mas porque se operara uma depressão em torno dele.
Haddad se destacou, em parte, pela depressão a seu redor na entrevista na Jovem Pan.
Imagine alguém que, em pleno 2015, consegue atacar ciclovias numa metrópole como São Paulo.
É Villa.
Suas observações, se fossem feitas em cidades como Londres ou Paris, o levariam ao ridículo e ao ostracismo imediatamente.
Mas no Brasil isso lhe dá microfones como o da Jovem Pan.
Haddad contou suas conversas com prefeitos de fora do Brasil a respeito das ciclovias.
Disse que é consenso que elas vem antes dos ciclistas. Sem as ciclovias, as pessoas não vão se arriscar em ruas perigosas.
Nem Sheherazade e nem Villa tinham a menor ideia sobre o assunto. Sobre nada, aliás – de semáforos quebrados ao preço do metro quadrado de uma ciclovia.
Ali estava, diante de Haddad, a ignorância enciclopédica personificada em dois entrevistadores sem a menor condição jornalística de sabatinar alguém.
Villa, a certa altura, jogou o Petrolão para cima de Haddad. Chegou a citar Gilmar Mendes, como se a opinião do meritíssimo valesse alguma coisa.
Haddad desarmou-o imediatamente. Afirmou que, como todo mundo, quer a punição de quem quer que tenha desviado dinheiro público na Petrobras.
E devolveu a Villa: “Você não quer que os corruptos do Tremsalão sejam presos? Você não quer que o conselheiro do TCU de São Paulo indicado pelo Covas sofra consequências pela conta na Suíça com dinheiro da corrupção?”
Villas balbuciou apenas, a voz mortiça: “Sim.”
Maluf também foi posto na conversa. Haddad disse que faz aliança não com pessoas, mas com partidos, e à luz do dia. Lembrou que Serra foi buscar o apoio do mesmo Maluf na calada da noite. “E você não disse nada”, completou.
Fora do campo objetivo, Haddad também enquadrou Villa com bom humor.
Ao responder a uma colocação, ele foi interrompido abruptamente. E então disse: “Puxa, Villa, vocês me atacam todos os dias. Deixa hoje pelo menos eu me defender.”
Haddad fez o que se espera de um político que sabe o que quer.
Villa e Sheherazade fizeram aquilo que é inevitável em entrevistadores que não sabem entrevistar.
Deu no que deu: nocaute.
***
*** *** CASO HSBC: QUANTO HÁ DE INDEPENDÊNCIA NA ¨MÍDIA INDEPENDENTE¨ ?
Um anunciante influente.
Quanto há de independência real na imprensa que os suspeitos de sempre gostam de chamar, peitos estufados, de “independente”?
O episódio da estrepitosa demissão de um colunista do jornal britânico Daily Telegraph joga luzes sobre este assunto.
Peter Oborne disse que saía porque a cobertura do jornal do caso HSBC é uma “fraude contra os leitores”.
O que o jornal não quer arriscar, segundo ele, é a publicidade milionária que o banco lhe garante.
Na Era Digital, anúncios são cada vez mais escassos para a mídia impressa – e o preço a pagar por isso é o que se está vendo no Telegraph.
A independência da mídia “independente” termina na necessidade de agradar seus anunciantes.
Nos dias de ouro da mídia impressa, o quadro era outro, e era possível alguma altivez – pelo menos em sociedades com mídia mais avançada que a brasileira.
Pertence à antologia do jornalismo o embate travado, algumas décadas atrás, entre a General Motors, então a maior montadora do mundo, e a revista de negócios Fortune.
Desgostosa com uma reportagem da Fortune, a GM decidiu suspender por seis meses a publicidade na revista, da qual era o maior anunciante.
Ao saber disso, a Fortune imediatamente publicou sua resposta. Propaganda da GM não mais seria aceita na revista.
Foi um momento de glória, talvez o último, na divisão entre Igreja (conteúdo) e Estado (publicidade) que foi a essência durante muitos anos da imprensa americana.
No caso do Telegraph, pelo relato de Oborne, a Igreja foi estuprada pelo Estado.
Não será fácil administrar os danos à imagem num país como a Inglaterra, em que a opinião pública tem o poder de fechar um jornal transgressor, como foi o caso do tabloide News of the World.
No Brasil, jornalistas que estiveram ou estão em postos de comando nas grandes empresas jornalísticas conhecem muito a dura realidade da “independência” da imprensa.
Tente encontrar alguma reportagem crítica na Folha – ou no Globo, ou na Veja, ou no Estadão – sobre um grande anunciante.
Há, aqui, um complicador adicional.
Como as empresas frequentemente estiveram à beira de quebrar, por decisões de investimento catastróficas tomadas por famílias pouco capacitadas, os credores também sempre falaram alto.
Vivi uma situação dessas.
Em 1997, quando eu dirigia a Exame, fizemos uma reportagem de capa sobre o banco Safra.
Eu já tinha lido e aprovado o texto quando Roberto Civita pediu para vê-la, o que jamais acontecera.
Imprimimos o artigo e mandamos para ele. Jamais recebemos de volta. Tivemos que improvisar uma capa na última hora.
Um dos irmãos Safras ligou para Roberto Civita para conhecer detalhes da capa. E ela acabou reprovada fora da redação.
Como Safra conseguiu isso?
Porque era um dos maiores credores da Abril.
Acabou ali minha ilusão sobre a força da Igreja diante do Estado na Abril.
Interesses poderosos estão por trás das grandes decisões editoriais nas empresas jornalísticas — ou de anunciantes, ou de credores, ou simplesmente dos próprios donos.
Infelizmente, aqueles interesses quase nunca coincidem com os do leitor.
*
|
TERRAS ALTAS DA MANTIQUEIRA = ALAGOA - AIURUOCA - DELFIM MOREIRA - ITAMONTE - ITANHANDU - MARMELÓPOLIS - PASSA QUATRO - POUSO ALTO - SÃO SEBASTIÃO DO RIO VERDE - VIRGÍNIA.
quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015
As críticas de Barbosa ao ministro da Justiça serviram, sobretudo, para ele vender suas palestras.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário