O triunfo do atraso.
Durou o que tinha que durar a melancólica aliança entre PT e PMDB na Câmara dos Deputados.
Ela começou a ruir quando Dilma se incomodou com o monumental preço a pagar por ela: não mexer no âmbito da Câmara em nada que ameaçasse velhos e irremovíveis privilégios.
E, por extensão, praticar o que existe de mais arcaico e deletério na política: o clientelismo que é a alma, o corpo, o tudo e o nada do PMDB.
Foi uma parceria que não elevou o PMDB e rebaixou o PT.
Cansada do custo de ter o PMDB ao lado, Dilma agiu a partir de determinado momento como alguém que não suporta mais um casamento mas não sabe exatamente como rompê-lo. Foi deixando claro o enfado, o desprezo pelo laço que a prendia — e ao país — a tanto atraso.
Eduardo Cunha aglutinou então, no PMDB, o batalhão dos descontentes e desprezados. O desfecho se deu ontem.
Não estava escrito, mas desde o princípio estava entendido que o apoio do PMDB a Dilma não seria mantido caso a pauta do governo abrangesse itens essenciais à sobrevida dos peemedebistas, como o financiamento privado das campanhas e a regulação da mídia.
O PMDB não sobrevive sem os milhões de reais que vão dar nele para defender uma agenda conservadora. E a regulação acabaria com o coronelismo eletrônico da elite do partido.
A situação, agora, é curiosa.
As Jornadas de Junho mostraram que o país já não suporta o tipo de política representado pelo PMDB.
E a eleição de Eduardo Cunha é a negação do desejo de renovação demonstrado nas manifestações.
Isso leva a uma conclusão: o futuro da agenda política nacional vai ser decidido nas ruas.
Para que o conservadorismo do PMDB não faça o relógio andar para trás, os movimentos sociais vão ter que se mexer.
A militância petista, nestes anos todos de Lula e Dilma, ficou em casa, temerosa de atrapalhá-los.
Agora, os militantes vão ter que tirar o traseiro do sofá – e não apenas para defender causas progressistas.
Trata-se, também, de proteger a democracia e impedir que prosperem ambições golpistas expressas numa palavra sinistra: impeachment.
Foi fácil derrubar Collor porque ele não tinha sustentação nenhuma nem nos partidos e nem na sociedade.
Seria muito mais complicado tentar o mesmo com Dilma – mas isso tem que ficar evidente para quem porventura pretenda enterrar 54 milhões de votos.
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http://www.diariodocentrodomundo.com.br/ja-era-mesmo-tempo…/
*** *** *** EDUARDO CUNHA, SEGUNDO CIRO GOMES. *** *** O PADRÃO GLOBO DE COBERTURA DE CASOS DE SONEGAÇÃO FISCAL DE ALHEIOS.
Um país cujo slogan é “Segredinhos da Natureza”
Esta reportagem faz parte da série do DCM sobre o escândalo de sonegação da Globo. Elas foram produzidas com financiamento dos leitores através do Catarse. As demais estão aqui.
Quando um hotel em Brasília quis dar emprego a José Dirceu, na época preso pelo caso do mensalão, um repórter da Rede Globo foi enviado ao Panamá com a tarefa de levantar informações sobre a offshore sócia da empresa no Brasil. Em tom de escândalo, a reportagem divulgou entrevistas e mostrou cenas para fazer o público concluir que era tudo fachada.
Se fizesse o mesmo sobre o caso da Empire Investment Group Ltd, nas Ilhas Virgens Britânicas, a TV não teria nem pessoas para mostrar. A empresa que a Globo manteve aberta durante um ano e meio nas Ilhas Virgens Britânicas nunca passou de uma caixa postal. “Fraude”, definiu o auditor fiscal Alberto Zile, ao descrever a engenharia financeira montada pela empresa para sonegar impostos do Estado brasileiro.
Nesse período, abriu e fechou duas empresas, e fez alterações no contrato social em outras quatro, algumas com a assinatura dos três filhos de Roberto Marinho.
Ao ver as provas coletadas pelo auditor fiscal, mostradas por mim, o advogado tributarista Jarbas Marchione, um dos mais respeitados em sua área no Brasil, ficou surpreso: “A semelhança com o esquema do Maluf é impressionante. Eles abrem e fecham empresas para tentar dificultar o rastreamento”, disse. “Mas as autoridades fiscais, não só no Brasil, aperfeiçoaram muito os mecanismos de investigação, e é por isso que descobriram esse caso de sonegação da Globo.”
Segundo Marchione, esse avanço não foi por acaso. Foi uma reação à escalada do terrorismo e do poder do narcotráfico. Os governos dos países desenvolvidos procuraram meios legais para cortar o fonte de financiamento de grupos criminosos nos territórios além de sua fronteiras. Com a crise econômica, o cerco começou a se fechar também para os sonegadores.
Quem não paga imposto acaba tendo uma vantagem desleal sobre seus concorrentes. O mesmo raciocínio se aplica à corrupção. O suborno em países alheios era tolerado em muitas nações europeias, como meio legítimo de obter contratos. Não é por outro motivo que a francesa Alston e a alemã Siemens deitaram e rolaram na compra de autoridades do governo paulista, para ganhar concorrências no Metrô e na CPTM.
Quando a prática deixou de ser não apenas imoral, mas também ilegal, o jogo mudou, e algumas corporações, para não serem condenadas nos países de sua sede, estão fazendo acordo, e reembolsando governos lesados. Por que será que o Deutsch Bank se apresentou espontaneamente para devolver recursos desviados da prefeitura que Paulo Maluf manteve lá durante algum tempo?
Outras empresas se antecipam ao escândalo para preservar a imagem. Não é o que acontece com a Globo. Até porque, detentora dos veículos de maior audiência e sócia de outros empreendimentos de comunicação, a emissora parece acreditar que controla essa variável. “Em nenhum país democrático liberal, uma única rede de televisão detém mais de 40 por cento de audiência”, diz o professor Marcos Dantas, titular da Escola de Comunicação da UFRJ, ex-secretário de planejamento do Ministério das Comunicações.
Para realizar esta série de reportagens, entrevistei Marcos Dantas e outros três pesquisadores da televisão no Brasil, e acabei descobrindo que, do ponto de vista teórico, os estudos sobre a Globo estão bastante avançados, embora praticamente nada se ouça a respeito. As entrevistas desses pesquisadores serão publicadas no decorrer da série.
“A concentração de mercado, num nível tão alto, como o que ocorre no Brasil no campo da comunicação, prejudica o direito à informação dos cidadãos, e cria um poder de lobby nefasto para a democracia”, afirma, por sua vez, o professor César Bolaño, formado em jornalismo pela USP, com doutorado em economia pela Unicamp e professor da Universidade Federal de Sergipe. Bolaño é autor do livro “Globo – 40 anos de poder”, que está esgotado.
No mundo das coisas visíveis, fatos recentes confirmam o que teóricos como Bolaño e Dantas estudam. Fora da internet, que veículo noticiou o desaparecimento na Receita Federal do processo que apurou a sonegação de mais de 180 milhões de reais (valores de 14 anos atrás)? Na véspera de ser enviado para o Ministério Público Federal, ao qual caberia denunciar criminalmente os filhos de Roberto Marinho, uma servidora pública interrompeu suas férias, foi até a Delegacia da Receita e levou os dois volumes mais o apenso do processo.
Em qualquer lugar do planeta, é notícia importante, mas por aqui o fato mereceu o silêncio da mídia. O poder de lobby da Globo foi descrito pelo professor Anderson David Gomes, num estudo sobre sobre o direito de transmissão do Campeonato Brasileiro de Futebol. Em 2001, a CBF cancelou os jogos das 21 horas de sábado, importantes para os negócios em pay per view e havia insinuações entre os clubes de futebol e o SBT — na final do campeonato, o Vasco jogou com o logo da emissora da Sílvio Santos na camisa.
A resposta veio através de um Globo Repórter, apresentado por Alexandre Garcia, com reportagem de Marcelo Resende. A emissora denuncia o enriquecimento de Ricardo Teixeira e diz que o então presidente da CBF tinha empresas em paraísos fiscais, “onde a lei é manter no mais absoluto sigilo o nome dos investidores”. Uma das empresas é a Ameritech Holding, nas Ilhas Virgens, onde, agora se sabe, a mesma Globo tinha uma empresa aberta para sonegar impostos, segundo a Receita Federal.
Para chegar às Ilhas Virgens Britânicas, o jeito mais prático é ir de avião até às vizinhas Ilhas Virgens Americanas, num voo que faz escala em Atlanta, na área dos Estados Unidos que fica no continente. Aproveitei a conexão para conhecer a redação da CNN, o canal de notícias com sede na cidade. A surpresa foi encontrar o prédio cheio de gente, e a maioria não era jornalista. Eram americanos — centenas num fim de tarde, mas soube que passam por lá milhares todos os dias — que fazem do endereço um ponto de encontro. Tem até uma praça de alimentação. Povo e jornalistas dividem o mesmo espaço. Para um brasileiro, impossível não comparar. A última vez que o povo tentou chegar ao saguão da emissora brasileira, em junho de 2013, em algumas capitais, foi para jogar estrume.
Globo Repórter - Corrupção na CBF e CPI do Futebol - Parte 3 |
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terça-feira, 3 de fevereiro de 2015
Já era mesmo tempo de acabar a aliança PT-PMDB.
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