quinta-feira, 5 de março de 2015

O Brasil à espera de Ulysses.

ulysses


Por Ana Helena Tavares, jornalista, editora do QTMD?


Assessores do Planalto confirmaram informação veiculada inicialmente pelo jornal O Globo de que o presidente do Senado, Renan Calheiros, e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, ambos do PMDB, estão na lista de envolvidos com a corrupção revelada pela operação Lava Jato. Neste mesmo país, há gente querendo o impeachment da presidente da República, cujo nome não aparece nem nesta lista nem em nenhum outro caso comprovado de corrupção.
Confirmando-se o envolvimento dos dois chefes máximos do legislativo, a pergunta que não quer calar é: os insatisfeitos botarão quem no lugar dela? O vice, que ao contrário do que acontecia em décadas atrás, não é mais eleito por votos próprios? O segundo colocado, envolvido em inúmeras acusações gravíssimas e cuja posse seria absolutamente inconstitucional? Os militares que desgraçaram este país?
Ou a pergunta talvez seja: quem o Brasil acha que estará lá em Brasília agindo de forma diferente da que o brasileiro comum age? Como poderemos pedir para ser salvos por Macunaíma, se ele, afinal, não tinha caráter? Quem estará em Brasília que não pague uma cervejinha ao guarda, que não sonegue imposto, que não arrume um jeitinho de pagar para ter vantagens? Que se prendam os corruptos! Porque é caso de polícia.
Mas que não se esperem soluções milagrosas que não valorizem a política no cotidiano. Em Portugal, há uma lenda que diz que os portugueses estão eternamente à espera da volta de Dom Sebastião, guerreiro desaparecido há séculos. Ao voltar, seria o redentor da pátria. Nós brasileiros estamos à espera de quem para nos redimirmos de nossos próprios erros?
Em nossa história recente, o único político de grande envergadura que desapareceu sem nunca se encontrar o corpo foi Ulysses Guimarães, fundador do Movimento Democrático Brasileiro, que deu origem ao PMDB. O velho timoneiro da democracia sumiu no mar levando consigo um conservadorismo lúcido que faz falta nos dias de hoje. Muitos desejavam vê-lo na presidência, mais do que a Tancredo.
Não se pode esquecer que Ulysses participou da marcha golpista de 64. Mas tentou se redimir. Tal como Juscelino Kubitschek, que certa vez afirmou – “não tenho compromisso com o erro” – Ulysses também não parecia ter. Conhecia a arte de voltar atrás quando percebia que causas maiores estavam em jogo. Foi um gigante na Câmara.
O que o Brasil precisa, portanto, é de uma oposição responsável. Mais do que um herói que salve a pátria – papel que só poderia caber ao Ulysses de Homero, mas dificilmente caberia ao nosso Ulysses humano e cheio de erros – o Brasil está precisando hoje da humildade dos que não se comprometem com o erro.

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