sábado, 2 de janeiro de 2016

2015: Eduardo Cunha protagoniza conservadorismo na política - Em um contexto marcado pela eleição do Congresso mais conservador desde 1964 – segundo levantamento realizado pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) - a Câmara dos Deputados foi protagonista de grande parte das discussões políticas deste ano. O principal personagem foi o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que mesmo investigado por corrupção se mantém no cargo.

A atuação de Cunha foi marcada pelos ataques a direitos históricos, denúncias de corrupção e articulações contra o Executivo.  


A Marcha Mundial das Mulheres, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) afirmaram que o presidente eleito para a Câmara dos Deputados é o principal inimigo do povo brasileiro e dos avanços sociais.

A atuação de Cunha foi marcada pelos ataques a direitos históricos, denúncias de corrupção e articulações contra o Executivo. Tendo despontado como grande ator político no início do ano, Cunha terminou 2015 encurralado, o que o levou a deflagrar o processo de impeachment.

Mulheres

Em suas primeiras atividades na Casa, o peemedebista se declarou contra a descriminalização do aborto. A frase “aborto só vai para votação por cima do meu cadáver” dita pelo deputado foi o primeiro sinal das “políticas” que viriam para as mulheres.

O projeto de lei (PL) 5069/13 ficou conhecimento como “PL do Estupro”. O texto diz que as vítimas de abuso sexual só poderão abortar caso comprovem a violência por meio de exame de corpo de delito. Além disso, ele prevê pena para qualquer pessoa que venda ou distribua qualquer substância que possa provocar o aborto.

"Hoje, o Boletim de Ocorrência não é necessário para se fazer o atendimento de saúde depois de um estupro. Então a mulher pode receber pílula do dia seguinte, coquetel contra HIV, etc. e também realizar o processo de interrupção da gravidez - que, nesse caso, é permitido pela legislação brasileira", explica a militante da Marcha Mundial das Mulheres, Maria Julia Monteiro. Monteiro acredita que o projeto é a “naturalização da violência contra a mulher”.

Em diversos estados do país, mulheres tomaram a rua contra os projetos de Cunha e exigiram sua saída. [Vale linkar a matéria que a Odara ta fazendo]

O Estatuto da família aprovado na câmara e que excluí famílias homoafetivas também foi alvo de críticas. No Rio de Janeiro, a Parada LGBT de 2015 teve como foco criticar texto legal e também o presidente da Câmara.

Terceirização

O Congresso teve destaque novamente durante o processo de votação do PL da Terceirização. Sindicatos e trabalhadores se opuseram à medida, mas não foi o suficiente para convencer a Câmara, que aprovou o texto.

O diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) Clemente Granz Lucio, tem uma avaliação negativa sobre o projeto de terceirização. Ele acredita que o trabalhador “perde salário e direitos”.

“A repercussão da terceirização, quando ela é feita com a intenção de reduzir custos, acaba sendo na diminuição da remuneração e na precarização das condições de trabalho, nesta relação entre as empresas, principalmente na contratação do setor de serviços. A empresa transfere parte de suas atividades para uma terceira que presta estes serviços”, avalia Clemente.

“Há também os serviços especializados, como TI, engenharia, assessoria, enfim, depende do tipo de serviço que a empresa necessita e que são altamente especializados. Eu diria que estes casos são a exceção, no grosso dos trabalhadores terceirizados, a terceirização ocorre para a redução de custos. Isto ocorre principalmente no setor de segurança, alimentação, limpeza e manutenção, tanto nas empresas quanto no setor público”, explica o diretor.

O Dieese analisa que um trabalhador terceirizado recebe cerca de 24 a 26% a menos que um trabalhador da própria empresa.

O PL 4330 permite que qualquer setor da empresa seja terceirizado, incluindo o setor fim, ou seja, a área na qual a empresa atua. “Seria como uma escola sem professores, empresa de engenharia sem engenheiro, um jornal sem jornalista”, pontua Clemente.

A proposta foi ao Senado para votação. Clemente explica que o novo texto foi à Casa revisora com alterações que contaram com a participação de sindicatos e incorpora mudanças para a proteção dos trabalhadores. No entanto, mantém no texto que as atividades fins podem ser terceirizadas.

“Com essa forma de terceirização para todas as áreas”, avalia o diretor, “poderia acontecer que várias empresas de fachadas fossem criadas, ou seja, totalmente precarizadas”.

Redução

Roberto da Silva teve conhecimento de perto da carceragem. Quando criança, foi preso na antiga Febem, hoje, Fundação Casa. Atualmente é professor livre-docente da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), na sua avaliação não havia intenção nenhuma na segurança pública quando a pauta da redução da maioridade penal foi levada a votação.

“Ele (Eduardo Cunha) elaborou uma estratégia para recuperar o prestígio do Congresso Nacional. Precisava de uma medida de apelo popular que mobilizasse a população, por isso ele desenterrou essa PEC de 1993”. Silva lembra que o Projeto de Emenda Constitucional (PEC) 171/93 foi a primeira reação do congresso contra o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), aprovada em 1993.

O processo de votação da redução da maioridade penal foi conturbado, Durante a primeira votação, no dia 30 de junho, o projeto foi barrado por não conseguir votos suficientes, porém, no dia seguinte (01), Cunha colocou em votação um texto com poucas alterações e, por fim, conseguiu fazer a proposta seguir para o Senado.

A votação do projeto levou movimentos para a rua e uma crítica assídua contra o projeto de redução. Entre esses movimentos está o Amanhecer Contra a Redução, um dos responsáveis por parte das ações de mobilização contra a proposta.

Questionado sobre a intenção do projeto, o professor da USP foi incisivo, “Isso não tem nada de segurança, isso não tem impacto nenhum na delinquência ou na redução da criminalidade. Não faz sentido!”. Para ele, quando Cunha colocou a pauta em votação foi também uma forma de desviar a atenção de outras pautas em jogo como a demarcação de terras indígenas, terceirização e Código Florestal.

Conselho de ética

O Conselho de Ética da Câmara dos Deputados analisa processo de cassação do mandato de Eduardo Cunha com base no pedido feito por parlamentares da Rede e do PSOL. Os trabalhos do colegiado foram dificultados: deputados aliados a Cunha fizeram por diversas vezes pedido de vista para a votação do procedimento. No dia 15 de dezembro, o conselho votou pela continuidade do processo, que só deve ser retomado em fevereiro por conta do recesso parlamentar.

O deputado Ivan Valente (PSOL-SP) avalia as manobras de Cunha e as denúncias contra ele o colocam contra a opinião pública, “as manobras do Cunha tendem a chegar num limite que causam um impacto grande na opinião pública. É uma figura que não pode permanecer a frente de uma das casas, ainda mais acusado de corrupção explícita”.

Na votação da redução da maioridade penal, após protestos de entidades estudantis e de jovens, o presidente da Câmara ordenou que a entrada na seção fosse limitada. No dia seguinte, durante a nova votação a casa estava totalmente fechada para a participação popular.

No dia 04 de novembro, militantes do movimento Levante Popular da Juventude foram presos de forma truculenta depois de terem jogado dólares em Eduardo Cunha. O protesto contra o deputado critica os dólares encontrados em contas na Suíça no nome de familiares do parlamentar.

Os jovens afirmam que pouco tempo antes, uma manifestação pró-impeachment havia sido muito mais truculenta, no entanto, não houve qualquer reação da polícia parlamentar.

No mesmo mês, outra cena de prisão aconteceu, desta vez nos salões da casa. No dia 25, jovens do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) foram presos por terem feito um protesto nas paredes da Câmara com lama, uma intervenção em forma de teatro que pretendia denunciar a atuação da Samarco, Vale e BHP-Billinton em Mariana (MG).

Os militantes criticavam a empresa por terem cometido crime ambiental na cidade mineira que acabou com o distrito de Bento Rodriguez e poluiu a bacia do Rio Doce com um mar de lama. No entanto, os manifestantes foram apreendidos sob a denúncia de “crime ambiental” pela utilização de lama na manifestação. 
 

Fonte: Brasil de Fato.

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