quarta-feira, 2 de maio de 2018

Suprema apequenação.

 



Prezado(a) Cezar Canducho,

As próximas horas serão decisivas para o futuro do Estado de Direito no Brasil. Se até amanhã (3 de maio de 2018), a Presidente da Suprema Corte, Cármen Lúcia, não se manifestar sobre a decisão da 2ª Turma, que transferiu para São Paulo, as delações da Odebrecht referentes ao Sitio de Atibaia e ao suposto terreno que seria destinado ao Instituto Lula, isso significa que o STF passa a se subordinar a Curitiba. Algo, simplesmente, incompatível com a vigência plena de um regime democrático.

A movimentação vista na última quinta-feira (26.04), com a divulgação da delação de Antônio Palocci e a promessa da delação de Renato Duque, ex-diretor da Petrobras, escancaram a reação de Moro e, obviamente, dos veículos de imprensa que passaram a bombardear a sociedade brasileira com as delações de Palocci, criando o ambiente político para delação de Renato Duque, com vistas a mexer no tabuleiro do Supremo. 

Basta ver as manchetes do G1: "Moro diz que processo do sítio de Atibaia deve ficar em Curitiba”. Fora o "desconhecimento" dos jornalistas do G1 ou as ordens do Editor, as matérias publicadas são incompreensíveis. Na realidade, Moro disse que esperaria o acordão do STF. Afirma, em seu despacho, que o “respeitável acórdão” do STF “sequer foi publicado” e que o processo contém “mais provas” que vão para além das delações de executivos da Odebrecht. 

Curiosamente, até o momento em que escrevo, o STF não reagiu sequer para explicar aos incautos o que foi decidido pela 2ª turma. Era o mínimo que deveria ter respondido. 

“Nunca antes neste país” se viu um juiz de primeira instância peitar a Suprema Corte dessa forma. Algo absolutamente inacreditável. Estamos assistindo, na prática, à Suprema apequenação da Justiça brasileira. O Poder Judiciário encontra-se soterrado em suas próprias razões. Se assim se confirmar, o medo, definitivamente, venceu a esperança. 

Sim, é verdade que o Judiciário estava de férias desde sexta-feira, alguns desde quinta-feira, outros desde sempre, aqui incluídos os que reclamam da morosidade do Judiciário. 

Uma observação: a alegar a morosidade da Justiça para justificar a prisão em 2ª Instância é tratar com cinismo uma questão crucial da Justiça brasileira que concede aos magistrados, aquilo que a Folha de S. Paulo, em reportagem de 1° de abril – "Ministros do Supremo têm 88 folgas ao ano além dos fins de semana", listou: “os magistrados contam também com 18 feriados ao ano, seis a mais do que a população em geral” (...) “excluídas as interseções entre férias, feriados e recesso, chega-se aos 88 dias de descanso, o que resulta em 196 dias úteis ao longo do ano - contra 227 em outras áreas do serviço público e na iniciativa privada”.

Em suma: os brasileiros têm que abrir mão das prerrogativas constitucionais, mais precisamente do seu direito a presunção de inocência, para permitir que as Excelências mantenham seus benditos dias de descanso intactos, afinal é muita responsabilidade, principalmente para quem ofende o maior bem do ser humano: a liberdade.

De qualquer forma, se lutamos a favor do trânsito em julgado, para sermos coerentes, devemos aceitar que o prazo para a Sra. Presidente, neste caso, ainda não transitou em julgado, em virtude das férias. Porém, o prazo que se admite é até esta quinta-feira para que o país saiba se a última Instância da Justiça brasileira fica em Brasília ou em Curitiba.

Aliás, pelo menos um breve Embargo de Declaração deveria ser "impetrado" pela Presidência da Corte, no sentido de exigir do Juiz Moro, uma explicação, um esclarecimento, uma palavra qualquer sobre suas afirmações. Tudo leva a crer, porém, que o prazo de embargos de Declaração será perdido. 

Não há dúvidas de que Palocci e Duque foram acionados apenas para ampliar as penas de Lula (até a perpétua). Se ambos delatores falarem o que o golpe deseja, saem com tornozeleira e milhões em conta corrente, vide os três anos de Yousseff ou os milhões de Barusco, que encontram-se em regime aberto.

Eles sabem o que estão fazendo com Lula ao aniquilá-lo com a perspectiva do encarceramento perpétuo.A guerra entre os poderes do Judiciário brasileiro, aliás, se dá em contexto nada favorável aos direitos humanos. Donald Trump acaba de indicar Gina Haspel para dirigir a CIA. Funcionária de carreira da área de inteligência, Haspel é conhecida por aceitar o uso da tortura conforme destaca Edward Luce, em artigo publicado no Financial Times (traduzido e publicado no Valor Econômico).

"A Cia tornou público um dossiê lisonjeiro sobre a carreira de Haspel. Mas ignorou pedidos do Senado para esclarecer as partes mais obscuras. Isso inclui as sessões de afogamento simulado na prisão secreta da CIA na Tailândia e sua suposta participação na eliminação de dezenas de vídeos de interrogatórios", aponta Luce.

É nesse contexto, portanto, que temos de observar a prisão política de Lula e a evidente tortura que representa o isolamento imposto ao ex-presidente. Ele não pode receber visitas de amigos, sequer médico autorizaram. Uma justiça menor permitida por um Supremo apequenado que se mostra claramente refém dos interesses corporativos que desmontam o Brasil que vínhamos construindo.

Com Lula, o futuro do Brasil será um; sem Lula, será outro. “Eles”, o sistema, sabe disso. E nós também. 

Foi justamente isso que milhares de pessoas gritaram em Curitiba, na cidade dos procuradores da Lava Jato, passando o recado de milhões de eleitores de Lula neste 1º. de Maio. 

Em São Paulo, a indignação somou-se à tristeza. O desalento ante à tragédia que se abateu sobre as famílias que ocupavam um prédio no Centro da capital. Escorraçado pelo povo, debaixo de vaias, Michel Temer voltou para o Jaburu. 

Não passa de uma farsa. 

O povo sabe quem é seu presidente. Sabe que seu presidente está sendo mantido preso injustamente. Sabe que essas delações agora não passam de cortina de fumaça e sabe, cada dia mais, o que essa imprensa está fazendo.

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Boas leituras,

Joaquim Ernesto Palhares
Diretor da Carta Maior

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