segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Pânico, nada! Vamos é tirar o tatu da toca.



Por Valter Pomar.

A sempre simpática Dora Kramer, jornalista de O Estado de S. Paulo, diz em sua coluna de 29 de agosto que “a possibilidade de uma derrota na eleição presidencial já estava no radar do PT há algum tempo“, mas que a partir do “fatídico dia 13 de agosto último“, a “derrota de Dilma já não se desenhava mais como uma hipótese remota. Enquadrava-se na moldura de uma possibilidade concreta“, acompanhada de derrotas nas eleições estaduais e do enfraquecimento “da legenda também no Congresso, reduzindo seu poder de fogo como força de oposição“.

Frente a isto, a reação das e nas hostes petistas seria de “terror e pânico“, a saber, fazer o “diabo a quatro” para “impedir que seja interrompida não a implantação de um projeto de País, mas a execução de um plano de ocupação hegemônica de todos os instrumentos de poder“.

Divertida esta senhora.

“Ocupação hegemônica” de todos os “instrumentos do poder” é algo que a classe dominante fez neste país, desde os tempos de antanho. Mas, claro, eles podem, os trabalhadores não.

Ademais, como executar um “projeto de país” sem ter instrumentos de poder?

Ou alguém acha que é possível implementar desenvolvimento, bem-estar social e soberania nacional, sem simultaneamente ampliar a democracia, sem fazer a classe trabalhadora ocupar mais espaços de poder??

Cá entre nós, o PT poderia ser acusado do contrário: de não lutar adequadamente por ocupar os “instrumentos de poder” que, desde 2003 e até hoje, continuam ocupados por representantes do grande empresariado e de partidos conservadores.

Vide a questão da democracia nas comunicações. O oligopólio da mídia vai de encontro aos preceitos da Constituição de 1988. E mesmo assim nossa presidenta peca por cautela, quando prefere falar em “regulação econômica” e não de “democratização da comunicação”.

A censura, a manipulação e a ditadura informativa neste país são praticadas todo santo dia pelos donos dos grandes jornais, revistas, rádios e tevês, que não aceitam nem democracia, nem regulação de nenhum tipo que limite sua “liberdade de empresa”.

Mas tudo isto é “pauta velha”, ainda que com tempero novo: os adeptos do “espírito animal” estão em festa, com a ascensão de Marina nas pesquisas. E acham que o outro lado está em pânico e aterrorizado. Ou que vamos recorrer ao pânico e ao terror. Ou ambas as coisas, a depender como se leia o texto da divertida Kramer.

Vamos por parte.

Não há motivo para ninguém do PT estar em pânico nem aterrorizado, pois desde 2012 já estava claro que as eleições de 2014 tendiam a ser disputadas no segundo turno (como 2002, 2006 e 2010); que este segundo turno seria mais “fácil” caso disputado contra o PSDB; e que seria mais “difícil” caso disputado contra uma candidatura que não fosse explicitamente tucana.

Claro que sempre há quem acredite em fadas, duendes e principalmente em anões. Aliás, estas pessoas também acreditavam que venceríamos no primeiro turno em 2006 e em 2010. E, naquelas duas eleições, só se deram conta de que haveria segundo turno no dia da apuração do primeiro turno. Hoje estamos melhor: mais de 40 dias antes, até o Dunga deve estar preparado para o segundo turno.

Quanto ao que deve ser feito para vencer, tampouco nada de novo, apenas o de sempre: debate político, polarização programática, mobilização social. Ou, noutras palavras, trata-se de tirar o tatu da toca.

Expliquemos: a oposição sabe que só ganharia as eleições presidenciais se conseguisse aparecer, para a maioria do eleitorado, como a portadora de mudanças.

Acontece que existe uma contradição antagônica entre a mudança desejada pelo povo e a mudança desejada pela oposição.

A mudança desejada pela oposição implica em desemprego, redução de salários, menos direitos, menos políticas sociais e democracia: é uma mudança para pior.

Por isto, a oposição não pode assumir abertamente seu programa, não pode dizer que tipo de mudança deseja para o país. Dizer que vão gerar desemprego, reduzir salários e investimentos sociais seria a derrota antecipada.

Neste ponto, a oposição se bifurca, seguindo por caminhos diferentes mas chegando ao mesmo ponto.

Aécio não pode falar do futuro que pretende construir, nem pode falar do seu próprio passado, quando ajudou a implementar no Brasil o programa neoliberal. Por isto se concentra em atacar “tudo isto que está aí”, ou seja, o governo Dilma.

Marina também dedica-se a atacar Dilma. Entretanto, ao contrário de Aécio, ela exalta enfaticamente o governo FHC (no qual elogia a “estabilização”) e o governo Lula (no qual elogia o “social”). Quanto ao que faria caso vencesse, isto fica envolto por uma blablação nebulosa que alguns chamam, inadequadamente, de “incógnita”, quando na verdade ela não pode falar claramente do futuro simplesmente porque isto demonstraria a afinidade entre seu programa e o programa do PSDB.

Tirar o tatu da toca é levar a oposição (tanto Aécio quanto Marina) a revelar o que pretende fazer. Na prática, trata-se de dizer o que nós fizemos e fazemos, mas principalmente o que faremos, chamando-os ao contraponto e desmascarando as afinidades neoliberais das duas candidaturas de oposição.

Fizemos isto em 2006, no segundo turno. E Alckmin saiu menor do que entrou. No fundamental é o mesmo que temos que fazer agora, confirmando que nosso programa é que pode materializar a mudança e o futuro que a maioria do Brasil deseja.

Mas para isto há três premissas.

A primeira é não ter dúvidas sobre a natureza da candidatura Marina. Ela não é uma incógnita, nem tampouco uma “Lula de saias”. Ela faz parte de um setor da esquerda brasileira que converteu o que poderia ter sido apenas necessidade (certas concessões ao neoliberalismo) em virtude (total adesão ao programa neoliberal).

A segunda é não ter dúvidas sobre a postura do grande Capital. Este, que alguns chamam pela sigla de “PIB”, vai apoiar qualquer um para derrotar o PT, mesmo que isto resulte num governo com tiradas de Jânio ou Collor.

A terceira é não ter medo de vencer. Medo de perder todo mundo tem (e é bom que se tenha). Mas medo de vencer é o que de pior pode haver, pois quem tem medo de vencer só sabe conciliar. E conciliar não fará o tatu sair da toca .

http://www.pagina13.org.br/publicacoes/panico-nada-vamos-e-tirar-o-tatu-da-toca-2/?utm_source=Página+13&utm_campaign=8a8dbbb242-RSS_EMAIL_CAMPAIGN&utm_medium=email&utm_term=0_60bd4442e9-8a8dbbb242-4876269



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Os dilemas do PT: esquerda, vou ver ?




Lula vai empunhar a mão esquerda de Dilma?

“Parte do PT torce para que a elite – apavorada com a inconsistência marineira – apóie Dilma. Isso significaria aceitar que Dilma vá mais para a direita para ganhar. Outra parte do PT imagina que a melhor forma de enfrentar Marina é aprofundar um programa trabalhista: Dilma teria que defender o fim fator previdenciário, redução da jornada de trabalho, mais direitos sociais, combate ao rentismo.”

Por Rodrigo Vianna.

Nunca acreditei que essa eleição seria decidida num turno único. O grau de insatisfação e a onda anti-petista no Brasil deixavam claro que – mesmo com Aécio e Eduardo no páreo, dois candidatos que tinham dificuldade evidente para representar a “mudança” – Dilma teria que enfrentar um turno final para conseguir o segundo mandato.

Aécio (com apoios fortes em Minas, São Paulo, Bahia e Paraná) deveria bater em 25% até o começo de outubro. Eduardo talvez chegasse a 15%. Dilma, com cerca de 37% ou 40%, teria que enfrentar os tucanos no segundo turno.

O PT se preparou pra isso. Para esse cenário. Era a velha estratégia de fazer pouca política, acreditando que mais uma vez bastaria dizer: “o governo deles é o de FHC, com desemprego e quebradeira; o nosso é o governo do povão e da inclusão social”. Agora, a campanha de Dilma parece desorientada para lidar com a nova realidade pós 13 de agosto (dia do acidente que matou Eduardo Campos), que não é propriamente nova.

Por uma questão operacional e jurídica, Marina não conseguiu legalizar a Rede ano passado. Por isso, e só por isso, o difuso mal-estar de junho de 2013 seguia ausente da campanha de 2014. Por isso, e só por isso, o número de brancos/nulos e de “não votos” era tão grande. A queda do avião mudou tudo. Marina virou a cara de junho na eleição -como escrevi aqui.

A força de Marina (com o perdão do péssimo trocadilho, nesse agosto fatídico) não caiu do céu. Ok, Marina é candidata da Neca Setúbal. Ok, esse papo de “nova política” é falso, além de perigoso e despolitizante. Mas acontece que o eleitorado que vai com a Marina não é a velha classe média anti-petista e tucana. É mais que isso. É a turma dos “celulares na mão”: Luiz Carlos Azenha foi quem melhor traduziu essa nova conjuntura aberta com junho de 2013.

Parte do PT (setor que parece ser majoritário) torce para que os tucanos desonstruam Marina – na base de escândalos e pauladas midiáticas. Mais uma vez, sem política de verdade. Ou então, para que a elite – apavorada com a inconsistência marineira – apóie Dilma num segundo turno. Isso significaria aceitar que Dilma poderia enfrentar Marina como opção pela direita. Seria desastroso para o PT, para os movimentos sociais e sindicatos.

Outra parte do PT e da militância de esquerda não se ilude com essa ideia, e imagina que a melhor (talvez a única) forma de enfrentar Marina é aprofundar um programa de esquerda. Dilma terá que caracterizar Marina como a candidata do grande capital, dos banqueiros. Ela, Dilma, terá que assumir as bandeiras da classe trabalhadora: fim do fator previdenciário, redução da jornada de trabalho, mais direitos sociais, combate ao rentismo.

A mim, parece que a primeira das escolhas é – além de tudo – uma ilusão. Acreditar que Dilma pode virar a opção “confiável” da direita seria desconhecer o ódio que leva empresários, banqueiros e donos da mídia a preferirem “qualquer coisa menos o PT” (como se ouve nas ruas dos bairros nobres de São Paulo, Rio e Brasília).

Mais que isso: quem acompanha os bastidores da eleição diz que jamais os candidatos petistas enfrentaram tamanha seca de recursos. Empresários decidiram que o PT já cumpriu seu papel, e gostariam de virar essa página.

A direção petista pode apostar na saída pela direita. E, numa conjuntura especialíssima, pode até colher uma vitória eleitoral com isso. Mas essa escolha, mesmo que traga vitória eleitoral (pouco provável), seria acompanhada de uma tripla e estrondosa derrota: política, ideológica e simbólica. Se o PT escolher esse caminho, selará seu destino ao lado do PS francês e do SPD alemão…

A outra alternativa é virar alguns graus à esquerda. Essa segunda alternativa pode levar a uma vitória apertada, num clima de grande confrontaçã política e ideológica no segundo turno. Ou pode levar a uma derrota eleitoral (com Marina ganhando apoiada pelos liberais e tucanos), mas que prepare o PT e o bloco de esquerda para uma reorganização: mais próximo dos movimentos sociais e dos sindicatos, esse bloco político pode ser decisivo no enfrentamento de uma agenda liberal que (com Marina ou com Aécio) será imposta ao Brasil.

Trata-se, portanto, de uma eleição decisiva para os rumos do Brasil, da América Latina e também para o futuro do PT como força (ainda) capaz de comandar um processo de reformas e democratização.

http://www.revistaforum.com.br/rodrigovianna/palavra-minha/os-dilemas-do-pt-esquerda-vou-ver.html


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