quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Justiça anula ato de 1ª instância e decide julgar coronel por crime na ditadura.


Como sempre escreveu aqui no blog o seu titular, ex-ministro José Dirceu, e como sempre insiste reiteradamente em entrevistas, artigos e demais pronunciamentos, não adianta resistirem, fazerem manobras protelatórias, terem medo e se acovardarem. Um dia virão à tona a revisão histórica e toda a verdade sobre o golpe civico-militar de 1964, a ditadura sustentada por 21 anos (1964-1985) e o fim, ou mudança no caráter recíproco, da Lei da Anistia.
Podem demorar, mas um dia virão. Às vezes até de forma inesperada, não programada na agenda política, como nesta semana, com essa decisão da Justiça Federal de São Paulo que reverteu a decisão de 1ª instância e decidiu julgar o coronel do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra pelo crime de ocultação de cadáver de um militante morto na ditadura militar.
O coronel comandou o DOI-CODI do 2º Exército – hoje Comando Militar do Leste -nos chamados anos de chumbo, os mais duros do regime militar, na 1ª metade dos anos 70. É a primeira vez que uma seção da 2ª instância da Justiça brasileira reverte uma decisão desconsiderando os benefícios da Lei da Anistia, possibilitando o julgamento de um acusado de crimes na ditadura.
Decisão, na prática, ignora caráter recíproco da Lei da Anistia.
O coronel Brilhante Ustra e o delegado aposentado Alcides Singillo foram denunciados pelo Ministério Público Federal (MPF) sob a acusação de ocultar o corpo de Hirohaki Torigoe (27 anos), assassinado pela repressão política, em São Paulo, em janeiro de 1972. Na denúncia, a Procuradoria sustenta que Torigoe foi levado vivo para o DOI-CODI quando Ustra comandava o órgão do Exército e que lá foi assassinado sob tortura.
Os procuradores repetem a argumentação de que o crime é permanente (não prescreveu) e que os acusados não podem se beneficiar da Lei da Anistia. Apontam que como o cadáver de Torigoe não foi localizado até hoje (ele foi sepultado com nome falso), seu assassinato é considerado um crime permanente.
Pela versão divulgada à época e sustentada pelas Forças Armadas (FFAA), Torigoe morreu durante tiroteio, ao resistir à prisão. Em janeiro deste ano, a 1ª instância da Justiça Federal de São Paulo considerou prescrito o crime de ocultação de cadáver atribuído aos dois agentes da ditadura. O MPF recorreu, alegando que ocultação de cadáver é delito permanente, imprescritível.
O recurso foi julgado nesta semana pela 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Por 2 votos a 1 e com base em tratados internacionais – dos quais o Brasil é signatário–, ela decidiu que Ustra e Singillo serão julgados pelo crime pela 5ª Vara Criminal de São Paulo.
E o jornal O Globo?
Não adiantou nada o jornalão carioca do Grupo Globo ter feito um mea-culpa meses atrás e reconhecido que errou ao apoiar a quebra da legalidade constitucional em 1964, apoiado o golpe e a manutenção da ditadura militar por 21 anos. Ontem o jornal fez um editorial – um de seus principais do dia – sob o título “Uma visão unilateral da Lei da Anistia”, no qual afirma que não será positivo para o país se a Comissão Nacional da Verdade (CNV) divulgar um relatório que não considere o sentido da negociação entre generais e a oposição no fim dos anos 70.
O jornalão retoma sua posição retrógrada de que se o relatório da CNV pedir a responsabilização criminal e punição dos criminosos da ditadura “os crimes cometidos pela chama esquerda armada” também terão de ser investigados. O jornal mas uma vez esqueceu que os integrantes da esquerda que atuaram na resistência e combate à ditadura já foram julgados durante o regime. Condenados, cumpriram suas penas. O jornal quer que sejam julgados uma segunda vez pelo mesmo ato?
O Globo esquece, também, que ao contrário do que ele diz, a anistia não foi negociada por generais com a oposição. Foi imposta. Foi uma anistia baixada pela ditadura nos seus estertores, mas segundo normas e leis internacionais ela não tem valor legal exatamente por ter sido imposta pelo regime criminoso.
O editorial é demonstração de que O Globo continua fiel ao lema seguido pela UDN que ele apoiava: “o preço da liberdade é a eterna vigilância…” Vigilante, a uma semana da entrega do relatório final dos 3 anos de trabalho da CNV, o jornalão vem com seu editorial contra o relatório e contra a revogação do caráter recíproco da Lei de Anistia, último entulho autoritário da ditadura, intocada desde que foi decretada há 35 anos.

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