segunda-feira, 15 de junho de 2015

PT: capitaneou a mudança de classe no poder.

Quando a esperança venceu o medo
Quando a esperança venceu o medo.
Em razão do 5º Congresso do PT, publicamos aqui duas opiniões sobre 0 partido.
A primeira contendo fortes críticas ao momento que o PT desemboca, após quatro mandatos presidenciais sucessivos, conquistados no voto e vencendo, para além de seus oponentes, fortes campanhas midiáticas conservadoras lançadas contra o partido, foi publicada ontem..
Hoje, nos valemos de um texto de Leonardo Boff, de março de 2015, para mostrar a outra face deste momento.
O medo é um sentimento que nos aprisiona e nos tira a ousadia para seguir lutando.
A esperança enche os corpos de energia e vitalidade para prosseguir mudando.
O texto de Boff mostra o porquê da articulada campanha de  ódio ao PT. Para o filósofo uma das razões vêm do trabalho que o partido empreendeu no poder, principalmente no que se refere a empoderar classes sociais marginalizadas ao longo de 500 anos de história e trazer para a agenda política do dia a dia, questões relevantes para os mais pobres, como a justiça social e a ascensão de classe: “…com o PT, esses que eram considerados carvão no processo produtivo (Darcy Ribeiro) e o rebutalho social, conseguiram, numa penosa trajetória, se organizar como poder social que se transformou em poder político no PT e conquistar o Estado com seus aparelhos. Apearam do poder, pelo voto, as classes dominantes; não ocorreu simplesmente uma alternância de poder mas uma troca de classe social, base para um outro tipo de política. Tal saga equivale a uma autêntica revolução social, pacífica e de cunho popular.”
Lula, na abertura do 5º Congresso do partido, disse que o PT está mais vivo do que nunca.  Apesar dos erros cometidos por alguns integrantes no desempenho do poder, o PT parece dispor de vigor para debater, com profundidade, assuntos caros para as suas bases sociais.
Boff encerra seu artigo, da mesma maneira que pensamos aqui, “…o PT não se corrompeu? Veja o mensalão? Veja a Petrobrás? Não defendo corruptos. Reconheço, lamento e rejeito os malfeitos cometidos por um punhado de dirigentes. Devem ser julgados, condenados à prisão e até expulsos do PT. Traíram mais de um milhão de filiados e principalmente botaram a perder os ideais de ética e de transparência. Mas nas bases e nos municípios – posso testemunhá-lo em dezenas de assessorias – vive-se um outro modo de fazer política, com participação popular, mostrando que um sonho tão generoso não se deixar matar assim tão facilmente: o de um Brasil menos malvado, mais digno, justo pacífico. As classes dirigentes, por 500 anos, no dizer rude de Capistrano de Abreu, “castraram e recastraram, caparam e recaparam” o povo brasileiro. Há maior corrupção histórica do que esta?”.
O PT tem seus vícios, mas também inúmeras virtudes, como qualquer corpo social. Mas pensamos que suas virtudes são mais abundantes que seus reconhecidos erros.

O que se esconde atrás do ódio ao PT (I)?

07/03/2015

Há um fato espantoso mas analiticamente explicável: o aumento do ódio e da raiva contra o PT. Esse fato vem revelar o outro lado da “cordialidade” do brasileiro, proposta por Sérgio Buarque de Holanda: do mesmo coração que nasce a acolhida calorosa, vem também a rejeição mais violenta. Ambas são “cordiais”: as duas caras passionais do brasileiro.

Esse ódio é induzido pela midia conservadora e por aqueles que na eleição não respeitaram rito democrático: ou se ganha ou se perde. Quem perde reconhece elegantemene a derrota e quem ganha mostra magnanimidade face ao derrotado. Mas não foi esse comportamento civilizado que triunfou. Ao contrário: os derrotados procuram por todos os modos desligitimar a vitória e garantir uma reviravolta política que atendesse a seu projeto, rejeitado pela maioria dos eleitores.

Para entender, nada melhor que visitar o notório historiador, José Honório Rodrigues que em seu clássico Conciliação e Reforma no Brasil (1965) diz com palavras que parecem atuais:

”Os liberais no império, derrotados nas urmas e afastados do poder, foram se tornando além de indignados, intolerantes; construíram uma concepção conspiratória da história que considerava indispensável a intervenção do ódio, da intriga, da impiedade, do ressentimento, da intolerância, da intransigência, da indignação para o sucesso inesperado e imprevisto de suas forças minoritárias” (p. 11).

Esses grupos prolongam as velhas elites que da Colônia até hoje nunca mudaram seu ethos. Nas palavras do referido autor: “a maioria foi sempre alienada, antinacional e não contemporânea; nunca se reconciliou com o povo; negou seus direitos, arrasou suas vidas e logo que o viu crescer lhe negou, pouco a pouco, a aprovação, conspirou para colocá-lo de novo na periferia, no lugar que continua achando que lhe pertence”(p.14 e 15). Hoje as elites econômicas continuam a abominar o povo. Só o aceitam fantasiado no carnaval. Mas depois tem que voltar ao seu lugar na comunidade periférica (favela).

Lamentavelmente, não lhes passa pela cabeça que “as maiores construções são fruto popular: a mestiçagem racial, que criava um tipo adaptado ao país; a mestiçavel cultural que criava uma síntese nova; a tolerância racial que evitou o descaminho dos caminhos; a tolerância religiosa que impossibiltou ou dificultou as perseguições da Inquisição; a expansão territorial, obra de mamelucos, pois o próprio Domingos Jorge Velho, devassador e incorporador do Piaui, não falava português; a integração psico-social pelo desrespeito aos preconceitos e pela criação do sentimento de solidariedade nacional; a integridade territorial; a unidade de língua e finalmente a opulência e a riqueza do Brasil que são fruto do trabalho do povo. E o que fez a liderança colonial (e posterior)? Não deu ao povo sequer os beneficios da saúde e da educação, o que levou Antônio Vieira a dizer:’Não sei qual lhe faz maior mal ao Brasil, se a enfermidade, se as trevas”(p. 31-32).

A que vêm estas citações? Elas reforçam um fato histórico inegável: com o PT, esses que eram considerados carvão no processo produtivo (Darcy Ribeiro) e o rebutalho social, conseguiram, numa penosa trajetória, se organizar como poder social que se transformou em poder político no PT e conquistar o Estado com seus aparelhos. Apearam do poder, pelo voto, as classes dominantes; não ocorreu simplesmente uma alternância de poder mas uma troca de classe social, base para um outro tipo de política. Tal saga equivale a uma autêntica revolução social, pacífica e de cunho popular.

Isso é intolerável para as classes poderosas que se acostumaram a fazer do Estado o seu lugar natural e de se apropiar privadamente dos bens públicos pelo famoso patrimonialismo, denunciado por Raymundo Faoro.

Por todos os modos e artimanhas querem ainda hoje voltar a ocupar esse lugar que julgam de direito seu. Seguramente, começam a dar-se conta de que, talvez, nunca mais terão condições históricas de refazer seu projeto de dominação/conciliação. Outro tipo de história política dará, finalmente, um destino diferente ao Brasil.

Para eles, o caminho das urnas se tornou inseguro pelo nível crítico alcançado por amplos estratos do povo que rejeitaram seu projeto político de alinhamento neoliberal ao processo de globalização, como sócios dependentes e agregados. O caminho militar será hoje impossível dado o quadro mundial mudado. Cogitam com a esdrúxula possibilidade da judicialização da política, contando com aliados na Corte Suprema que nutrem semelhante ódio ao PT e sentem o mesmo desdém pelo povo.

Através deste expediente, poderiam lograr um empeachment da primeira mandatária da nação. É um caminho conflituoso pois a articulação nacional dos movimentos sociais tornaria arriscado este intento e talvez até inviável.

O ódio contra o PT é menos contra PT do que contra o povo pobre que por causa do PT e de suas políticas sociais de inclusão, foi tirado do inferno da pobreza e da fome e está ocupando os lugares antes reservados às elites abastadas. Estas pensam em fazer, com boa consciência, apenas caridade, doando coisas, mas nunca buscando a  justiça social.

Antecipo-me aos críticos e aos moralistas: mas o PT não se corrompeu? Veja o mensalão? Veja a Petrobrás? Não defendo corruptos. Reconheço, lamento e rejeito os malfeitos cometidos por um punhado de dirigentes. Devem ser julgados, condenados à prisão e até expulsos do PT. Traíram mais de um milhão de filiados e principalmente botaram a perder os ideais de ética e de transparência. Mas nas bases e nos municípios – posso testemunhá-lo em dezenas de assessorias – vive-se um outro modo de fazer política, com participação popular, mostrando que um sonho tão generoso não se deixar matar assim tão facilmente: o de um Brasil menos malvado, mais digno, justo pacífico. As classes dirigentes, por 500 anos, no dizer rude de Capistrano de Abreu, “castraram e recastraram, caparam e recaparam” o povo brasileiro. Há maior corrupção histórica do que esta?

Voltaremos ao tema.

*Leonardo Boff é colunista do Jornal do Brasil, teólogo, filósofo e escritor
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