Por Antonio Prata
Desde os longínquos anos oitenta do século passado, quando perigava do Lula ganhar as eleições presidenciais, a direita brasileira ameaça deixar o país. Segundo apregoava o então presidente da Fiesp, Mario Amato, em caso de uma vitória petista, 800 mil empresários picariam a mula: "O último a sair, por favor, apague a luz do aeroporto", teria dito.
Neste segundo mandato de Dilma Rousseff, o projeto da diá$pora voltou com tudo. Pelo que leio e ouço por aí, tem mais rico brasileiro se mudando pra Miami, hoje, do que turista japonês tirando foto da Mona Lisa no Louvre.
Acho curioso. Se alguém deveria estar contente com o estado das coisas, é a direita. Os índices de aprovação da presidente são os mais baixos da história, o Congresso quer rever o Estatuto do Desarmamento e diminuir a maioridade penal, já disse que não vai tocar no tema do aborto e tenta retroceder nas conquistas LGBT, Bolsonaro & Feliciano fazem mais sucesso do que Chitãozinho & Xororó e a PM que desce o sarrafo em professores e mata criança com tiro de fuzil é aplaudida em passeatas "ordeiras" e "pacíficas". Se eu fosse de direita, não estaria pensando em fugir pra Miami, mas em construir uma Disney lá pros lados de Barueri.
Quem tem motivo para se arrastar por aí chutando tampinha e rosnando pra lua somos nós, companheiros, que colamos o adesivo "oPTei" em nossos Chevettes, lá por 1987, nós que cantamos o "Lula Lá" como se fosse um "Abre-te, Sésamo!" para Shangri-La, achando que o PT iria levar pão, poesia, matemática e tomografia para cada brasileiro. Que tristeza: apostamos num partido fundado por Sérgio Buarque de Holanda e Chico Mendes para fazer "dessa vergonha, uma nação", como cantou Caetano Veloso, e, hoje, nossa expectativa mais otimista são alguns quilômetros de ciclovia.
É preciso reagir, meus caros. É preciso tirar da direita as rédeas da história. É preciso dar um passo à frente e dizer: péra lá, não são vocês que vão embora, com seus jacarezinhos no peito e Rolex no pulso, somos nós, com nossas pochetes na cintura e barbas por fazer! Chega de tentar tirar o gigante adormecido do seu berço esplêndido. (Aliás, um gigante de 500 anos que ainda dorme em berço, já era para termos nos tocado, tem algum problema bem sério). Chega de querer construir um país do zero: nos mudemos, de mala e cuia, para um que já esteja pronto.
Para onde vamos? Pra Miami? Evidente que não. Vamos para outra cidade onde a língua também é o espanhol, mas num país cujo governo é –verdadeiramente– de esquerda, a maconha é liberada, o vinho é de primeira, a carne é estupenda e o maior defeito, ao que parece, é fazer fronteira com o Brasil. Estou falando, claro, do Uruguai.
Se o Haddad perseverar e o MP parar de encher o saco, talvez consigamos ir de bicicleta até o porto de Santos, de onde seguiremos, em comboio, de pedalinho, rumo ao Éden cisplatino. Às margens do Prata, fundaremos a nova Colônia Cecília, requereremos nacionalidade uruguaia, e, ao recebê-la, sob o radioso sol de nossa alviceleste bandeira, brindaremos com tannat, simultaneamente, duas tão sonhadas conquistas: um país justo e a Copa de 50.
O último a sair, por favor, acenda o baseado.
*Artigo originalmente publicado na Folha de São Paulo no dia 03 de maio de 2015.Antonio Prata.
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