terça-feira, 24 de janeiro de 2017

Mistério, dúvidas, desagregação e inconfiabilidade.


Foto: Fábio Motta/AE

Por Luis Edmundo Araujo, colunista do Cafezinho

“Ministros são contra Cármen Lúcia homologar delações”, diz a manchete de hoje do Globo, que combina com a do Estado de São Paulo, na qual “ministros do STF divergem sobre relatoria da Lava Jato”. A imagem do avião onde morreu Teori Zavascki e mais quatro pessoas sendo retirado do fundo do mar estampa as capas dos dois jornais, como esta aí de cima, do diário carioca, e tudo ainda é confusão e dúvida sobre a queda do jatinho particular, sobre o futuro substituto do ministro falecido e, também, sobre quem herdará dele a relatoria do processo da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal. Certeza mesmo, por enquanto, é que nem a presença do Exército nas ruas levou o sossego necessário a Natal, que “chegou ao quarto dia seguido sem transporte público, por temor de ataque das facções” que levaram o caos aos presídios, como diz a legenda da maior foto da primeira página da Folha de São Paulo, na qual dois soldados empunham suas armas em cima do que parece ser um tanque de guerra.
A Folha, aliás, não publica mais nada na primeira página sobre a repercussão do desastre aéreo com o ministro do STF relator da Lava Jato, a não ser a chamada para o artigo de Celso Rocha de Barros, cujo título diz que “morte de Teori embaralha as cartas para 2017”. “A previsão era um ‘fevereiro do fim do mundo’, com a eleição para presidente da Câmara e a homologação das delações pelo ministro Teori Zavascki. Com sua morte, todos os cálculos, todas as projeções e estratégias terão que ser revistas”.
Aumenta a indefinição, crescem as incertezas e no site Poder 360, Fernando Rodrigues surge com a nova tese de que a morte do ministro que atrasa o processo da Lava Jato foi, na verdade, ruim para o presidente Michel Temer, citado 43 vezes nas delações que estavam prestes a ser homologadas por Teori Zavascki. Para justificar essa tese, Rodrigues afirma que o “STF estava prestes a colocar mais freios na Lava Jato” e que a soltura de Eduardo Cunha “seria ponto da virada”.
Segundo Rodrigues, “as investigações da Lava Jato são inevitáveis. Suas consequências (possível queda de ministros e de políticos relevantes no Congresso) são inexoráveis” e “quanto mais se espera por esse desfecho, mais fragilizado fica o Palácio do Planalto”. Agora, com a morte de Zavascki, “todos ficarão à espera de novas delações, sem prazo para surgir”, e esse “é o pior cenário para o governo de turno”. E ao dizer que “as delações estão encaminhadas”, Rodrigues afirma também que o “mais relevante no curto prazo é como Teori se posicionaria a respeito da concessão ou não de um habeas corpus para o ex-deputado Eduardo Cunha”.
“O Poder 360 sabe que estava se formando, ao poucos, uma maioria dentro do STF para colocar o que alguns ministros chamam de ‘freio’ na força-tarefa de Curitiba, diz Fernando Rodrigues, para em seguida lembrar que “Teori Zavascki, que em 2015 já havia liberado da cadeia o banqueiro André Esteves, caminhava nessa direção do garantismo também para outros presos da Lava Jato”. Segundo ele, a libertação de Cunha seria não só um “marco relevantíssimo nas investigações”, como também um “grande alívio para o Palácio do Planalto, que vive atormentado com a eventual delação premiada do ex-presidente da Câmara”.
Mas com a morte de Zavascki, “tudo mudou”, afirma Rodrigues, que pergunta “como os 10 ministros poderão, pós-morte de Teori, liberar da cadeia aquele que ocupa o papel de malvado favorito no imaginário do brasileiro?” Diante disso, o diretor de redação do Poder 360 garante que “tudo considerado, é apenas uma miragem que se evanesce a interpretação de que a morte de Teori Zavascki ajuda a controlar a Lava Jato.”
Em seu blog no Globo, Lauro Jardim noticia que “OAB pede que Cármen Lúcia cuide da Odebrecht”. A Ordem dos Advogados do Brasil, segundo Jardim, quer que a presidente do STF faça a “homologação das delações da Odebrecht ainda durante o recesso do Judiciário, que termina na semana que vem”. A entidade diz ainda, em nota oficial, “que neste momento, é preciso acabar com a indefinição sobre os rumos da principal investigação em curso no país”. Mas as notícias de hoje mostram que tudo deve ser mais complicado, e mais lento, do que pediam, ou previam as declarações dadas sob a comoção inicial com a morte de Zavascki.
A homologação das delações por parte de Cármen Lúcia “causaria insegurança jurídica”, de acordo com o argumento de ministros do STF não identificados, exposto no subtítulo da manchete do Globo. No Estadão, também no subtítulo da principal notícia da primeira página, “magistrados se dividem entre escolher novo relator na Segunda Turma ou entre todos os membros da Corte”. As duas notícias mostram que não é pequena a possibilidade de que tudo seja resolvido sem pressa, enquanto começa a ganhar força na grande mídia, de maneira até discreta, a tese mais conveniente de que tudo não passou de um acidente
“Filho diz que PF investigou ameaças a Teori”, afirma a chamada do Globo na qual “o advogado Francisco Zavascki, filho de Teori Zavascki, revelou ontem em entrevista ao ‘Fantástico’ que, a pedido do pai, foi aberto inquérito na Polícia Federal para investigar ameaças. A PF, no entanto, informou que não havia risco real”, conclui o texto, enquanto Aldo Fornazieri afirma no GGN, site de Luis Nassif, que ” mesmo que não haja indício de atentado na morte de Teori e dos que o acompanhavam, temos, não só o direito, mas o dever de suspeitar de que o avião caiu por iniciativa criminosa.”
“A morte de Teori e o dever da suspeita” é o título do artigo no qual Fornazieri afirma que a desconfiança tem como justificativa maior o “ato de que o Brasil vive um momento histórico de inconfiabilidade generalizada”. De acordo com ele, “é como se o país estivesse se dissolvendo no ar em face da inexistência de nenhuma força com poder de agregação. Pelo contrário, todas as forças que atuam no país parecem centrífugas e estilhaçam a sociedade cada vez mais em conflitos, em desagregação e em inconfiabilidade”.
E para aumentar ainda mais a desconfiança, o Estadão publica que “Michel Temer recebeu o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Gilmar Mendes, para um jantar na noite deste domingo (22) no Palácio do Jaburu”. O encontro teve ainda a presença de Moreira Franco e “não constava na agenda oficial da Presidência, que segundo a assessoria de imprensa do Planalto, só traz compromissos públicos de Temer, o que não seria o caso dessa visita”.
Já a assessoria do ministro do STF afirmou que Gilmar teve uma “conversa de rotina” com Temer. O Estadão lembra que “Gilmar é responsável por definir a pauta de julgamento do TSE e será um dos sete integrantes da Corte Eleitoral que votará neste ano no processo que pode levar à cassação da chapa de Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (PMDB).” E no Tijolaço, Fernando Brito ironiza “o encontro de ‘bons amigos’ de ‘mais de 30 anos'”
Gilmar Mendes, Moreira Franco e Michel Temer “discutiram, certamente, a atuação de Rogério Ceni como técnico do São Paulo na Copa da Flórida. E também a reestreia do valente time da Chapecoense”. “Dois denunciados nas delações da Lava Jato e um ministro que pode vir a ser o novo relator do caso, com a morte de Teori Zavascki, numa tarde de domingo, pura inocência”, completa o jornalista, que conclui lembrando que “de lambuja, o ‘amigo de 30 anos’ Mendes vai julgar no TSE a cassação do usurpador presidencial”, arrematando com um “Viva o Brasil!’
Ricardo Noblat diz na capa do Globo que “relator da Lava-Jato será fruto de acordo no STF”. “Haverá entendimento entre os ministros. E quando uma maioria se estabelecer em torno de um nome, ele será o escolhido”, afirma o colunista que no fim da colunista, aposta no decano da Corte, Celso de Mello. Na primeira página do Estadão Vera Magalhães diz que “Cármen Lúcia ainda não ouviu os colegas sobre as opções, mas começará a chamá-los nesta semana”. Ela afirma também que “os ministros acreditam que, ainda que consulte um a um, ela decidirá sozinha”.
Até lá, segue a indefinição, permanecem as dúvidas e o mistério acerca dos motivos da queda do avião onde viajava Teori Zavascki. E segue o caos na capital do Rio Grande do Norte, onde a presença do Exército ainda não tranquilizou ninguém e pode ainda piorar a situação, como mostra a matéria da Carta Capital, cujo título afirma que “presença de militares pode aumentar ainda mais a tensão em presídios”.
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